O número de famílias portuguesas com contas bancárias penhoradas está a aumentar de forma exponencial. Desde a entrada em vigor de regras mais flexíveis para bloquear os depósitos, a 1 de Setembro de 2013, foram penhorados por dia 670 mil euros a portugueses com dívidas em tribunal.
De acordo com os dados revelados ao SOL pelo presidente da Câmara dos Solicitadores, José Carlos Resende, foram realizadas mais de 108 mil penhoras electrónicas sobre depósitos bancários de Setembro de 2013 a Novembro deste ano.
O montante total penhorado desde Setembro já ultrapassa os 289 milhões de euros. O presidente da Câmara dos Solicitadores estima que «o valor correspondente a penhoras electrónicas de depósitos bancários possa chegar aos 300 milhões de euros até ao final deste ano».
Feitas as contas, todos os dias os agentes de execução – advogados e solicitadores que cobram pequenos créditos e contas que as famílias deixam de pagar, como água, luz ou telecomunicações – bloqueiam 250 contas sem despacho de juiz. O valor médio da penhora fixa-se em 2.673 euros.
A maior celeridade deste processo executivo está relacionada com o novo Código de Processo Civil. Até Setembro de 2013, a penhora dependia de um prévio despacho judicial, «o qual raramente era negado, embora muito demorado em todas as comarcas com grande pendência processual», recorda José Carlos Resende.
A penhora realizava-se com base na troca de correspondência, um «processo caro, moroso e pouco eficaz», o que justificava o raro recurso a este mecanismo.
As estatísticas mais recentes mostram que o processo acelerou – fica concluído num prazo máximo de seis dias –, embora evidenciem também as dificuldades das famílias em fazer face aos seus compromissos financeiros quando confrontadas com situações de desemprego, doença ou divórcio (os ‘3D’ do endividamento).
«A introdução da penhora electrónica permitiu saber, graças à colaboração do Banco de Portugal e num espaço de 24 a 48 horas, quais são os bancos onde um devedor tem contas bancárias», explica o responsável. Depois, através de uma plataforma informática, os bancos são contactados pelos agentes de execução para se proceder ao bloqueio das contas do devedor. «Logo que o agente recebe informação acerca dos montantes disponíveis, determina a penhora do valor necessário e desbloqueia o restante», explica o presidente.
A penhora deve salvaguardar o valor equivalente ao salário mínimo nacional (505 euros desde Outubro) e incidir apenas sobre o remanescente. Além disso, a instituição bancária e o agente de execução devem dar preferência a contas em que o executado seja o único titular e a depósitos a prazo ou aplicações semelhantes.
«Podemos dizer que temos actualmente um sistema de penhora electrónica de depósitos bancários inovador a nível europeu, tendo esta solução representado um grande avanço para o processo executivo», considera José Carlos Resende.
O presidente da Câmara dos Solicitadores salienta que o novo sistema reduziu o recurso às penhoras de bens móveis – um «mecanismo caro, pouco eficaz e que acarreta a humilhação dos executados perante a família, vizinhos e todos aqueles que os rodeiam».
O novo Código de Processo Civil surgiu no âmbito das reformas acordadas com a troika para melhorar a eficácia do sistema judicial e aumentar a transparência. Na prática, esta é uma das cinco grandes medidas implementadas e que o próprio Governo elogia no relatório do Orçamento do Estado para 2015: o procedimento extra-judicial e pré-executivo, a nova lei da organização do sistema judiciário, o sistema excepcional de recrutamento de novos administradores judiciais e o reforço dos mecanismos concedidos aos mediadores privados na resolução alternativa de litígios.
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