São dados de 2011, divulgados no recente relatório da OCDE sobre despesa social nos 34 Estados membros. Há três anos Portugal gastava um quarto do PIB em apoios sociais do Estado, um pouco acima da média da OCDE (21,4%). A crise da dívida pública portuguesa terá entretanto baixado esse valor.
Mas, ainda que não tivesse havido a crise que nos atingiu em 2011, com a austeridade que ela implicou, seria impossível ao Estado português manter nos próximos anos ou mesmo décadas a estrutura até então vigente de apoio social. O rápido envelhecimento da nossa população aumenta os encargos públicos em pensões e saúde, ao mesmo tempo que reduz as contribuições dos trabalhadores no activo para a segurança social.
Acresce não ser previsível que a nossa economia venha a ter um bom crescimento a curto e a médio prazo, o que limita as receitas fiscais do Estado e mantém elevados os seus gastos com subsídios de desemprego. “Quando, em meados dos anos 70, se construiu o Estado-Providência em Portugal, a previsão de crescimento económico que lhe estava subjacente era de 5% ao ano. Tal valor nunca foi alcançado e não é expectável que o venha a ser nos próximos anos”, escreveu Filipe Carreira da Silva em O Futuro do Estado Social (ed. Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2013).
Tal como está hoje (e já vários benefícios foram cortados), o Estado social português não é sustentável – tem que mudar. Ora o estudo da OCDE revela que em Portugal 40% do total das transferências sociais pecuniárias, a maior parte da nossa protecção social (não incluindo, portanto, os serviços prestados, mas incluindo nomeadamente as pensões de velhice, invalidez e sobrevivência), destinam-se aos 20% mais ricos. Para os 20% mais pobres, o Estado português destina pouco mais de 10% daquelas transferências. Na Austrália, Noruega e Dinamarca a proporção é inversa.
Entre os 34 membros da OCDE uma situação destas apenas ocorre no México. A OCDE diz que nos países mediterrânicos as transferências vão sobretudo para as famílias mais ricas, porque muitas são altas pensões pagas a trabalhadores aposentados. Compreende-se, mas não se aceita no caso português, até porque nos outros países do Sul da Europa o desequilíbrio em favor dos mais ricos é menor.
Eis aqui mais uma razão para – contra os puristas do Estado social – em Portugal se avançar na discriminação positiva em favor dos mais pobres. Se há pouco dinheiro, que ele vá para quem comprovadamente mais precisa. Tal implicaria que nos serviços de saúde, por exemplo, se pagasse em função dos rendimentos de cada um.
Esta discriminação positiva atinge um alto grau em países como a Austrália, o Canadá ou mesmo a Irlanda, mas é baixa entre nós, como o é noutros países da UE. Em teoria, o ideal seria o Estado prestar serviços gratuitos para todos e redistribuir a riqueza através do IRS. Só que a realidade é outra. Protecção social que não protege os mais necessitados é um absurdo.