Passos Coelho: a troika foi um Pai Natal bem generoso!

1. Este Natal está a correr de feição para o Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho. Normalmente, esta quadra marcada pela compaixão e amor pelo próximo é tempo de acalmia nas disputas políticas: nada sucede com relevância política entre o Natal e a entrada no ano novo.  E mesmo quando factos políticos relevantes ocorrem em tal período…

2. O primeiro facto político relevante foi o relatório da troika muito crítico em relação à actuação do Governo Passos Coelho, sobretudo após o término do programa de assistência económico-financeira (leia-se, da saída dos senhores representantes das instituições que compõem a dita troika). E quais foram essas críticas? Falta de sensibilidade social do executivo? Falta de um discurso mais positivo e galvanizador, que instile confiança na economia e possa melhorar os índices de produtividade e competitividade nacionais? Não, não e não. A troika critica Passos Coelho por ser…demasiado brando. Por não aplicar devidamente as políticas estruturais sugeridas pela troika – omissão essa agravada, segundo os doutos senhores do  FMI, da Comissão Europeia e BCE, após cessar a sua permanência, a tempo inteiro, em território nacional. Em suma: sem os puxões de orelhas da troika, Passos Coelho e seus colegas de Governo portam-se mal. Muito mal!

3. Pois bem, estas críticas vindas da troika foram um verdadeiro presente de Natal para Passos Coelho e para a coligação de direita. Porquê? Por três razões:

i) Tais críticas, de natureza técnica mais do que política, longe de colocar em causa a competência do Governo em termos de planeamento e execução orçamental, colocam em cheque a própria troika. São, pois, críticas que funcionam em boomerang, descredibilizando (ainda mais?) as instituições europeias (e também o FMI).  Isto porque, durante a permanência da troika em Portugal, esta foi elaborando sucessivas avaliações do grau e do modo de cumprimento do memorando sobre as condicionalidades da política económica e financeira por parte do Governo. Resultado? A actividade deste mesmo Governo, liderado por Pedro Passos Coelho, foi sendo classificada com nota positiva (e, por vezes, com distinção), merecendo rasgados elogios dos mais altos responsáveis das instituições internacionais que formam a troika. Então, até à saída da troika, o Governo era excelente – depois da saída, passou a ser incompetente? Em que ficamos? Só prova que a troika, no meio do caos decisório em que vivemos, é quem está menos bem preparada para lidar com as questões prementes – a vários níveis e de diferentes natureza – colocadas a Portugal, à Europa e ao Mundo. Quem merece reprovar com distinção, à descarada, é mesmo a troika. Os senhores da troika limitaram-se, enfim, a assinar um atestado de incompetência a si próprios;

ii) As críticas da troika permitem ao Governo Passos Coelho mudar o seu discurso político. Durante quase quatro anos, Passos Coelho foi acusado pela esquerda – e, em especial, pelo Partido Socialista – de querer ir além da troika, impondo uma agenda ultra-liberal, direitista. A roçar a desumanidade, por impor os “imperativos orçamentais à frente das pessoas” (eis o slogan panfletário que se tornou muito fashion entre os socialistas). Afinal, de repente, todos acordámos para a realidade: os próprios senhores da troika – primeiros interessados na implementação desses imperativos orçamentais – vieram desmentir essa narrativa política! Meus caros leitores, afinal, a troika considera que Passos Coelho pecou por…ficar aquém, bem aquém, da troika. Afinal, o Governo até abrandou na execução das políticas sugeridas pelos senhores da troika porque achava desajustado para a realidade social portuguesa. E esta, hein?

iii) Por último, as críticas da troika são mais uma estalada violenta no discurso e na estratégia do Partido Socialista. O PS andou nos últimos quase quatro anos a zurzir no executivo de Passos Coelho por ir além da troika – prometendo, em alternativa, que quando fosse Governo, o ritmo das reformas abrandaria. E, com António José Seguro, o PS chegou a eleger a troika como seu adversário político de eleição. De repente, tudo isto muda: a própria troika demarca-se do Governo Passos Coelho; vem dizer que o Governo ficou aquém do acordado, por razões de política social e que, afinal, Passos Coelhoe Paulo Portas foram negociadores muito duros. O que desmente a tese do PS da subserviência da direita às imposições exteriores. Resta perguntar: com que discurso fica o PS? O PS – registe-se bem, meus caríssimos leitores, – andou a ter um discurso, nos últimos quase quatro anos, inútil! Ou, como se diz na linguagem do Direito, um discurso inexistente por não verificação dos seus pressupostos de facto – no caso, dos seus pressupostos políticos.

4. Uma última nota para dizer que a mensagem de Passos Coelho, no dia de Natal, foi muito bem conseguida. A apelar a um novo ciclo – um ciclo de esperança! A apontar para uma estratégia muito interessante: a de propor uma “esperança realista” ou uma “esperança dentro do realismo”. Voltaremos à estratégia de Passos Coelho brevemente. Oportunidades certamente não faltarão no ano que se segue dentro de momentos…

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