2. Para além da questão de vaidade pessoal – Mário Soares é um “bicho mediático”, que não sabe viver longe dos holofotes – , Soares, como já aqui explicámos neste nosso espaço no SOL, percebe que a prisão de José Sócrates pode afectar gravemente o Partido Socialista. É que já são muitas condenações de ministros socialistas (todos ligados a José Sócrates) e o actual prisioneiro preventivo de Évora está ligado à pré-bancarrota de Portugal. O que leva, naturalmente e bem, os portugueses a questionar a credibilidade da elite política do PS, com consequências ainda imprevisíveis.
3. Não nos esqueçamos, ainda, que Mário Soares jantou com José Sócrates e Manuel Alegre dias antes da detenção do ex-Primeiro-Ministro. Preparavam o regresso à política de Sócrates, com o alto patrocínio dos senadores socialistas. Ora, se já não era fácil para Mário Soares explicar a confiança que depositava num Primeiro-Ministro que conduziu o país a uma situação de ruptura económico-financeira – e logo social -, mais complicado se tornou explicar a sua ligação ao único ex-Primeiro-Ministro detido em Portugal. Ainda para mais – e caso as suspeitas se confirmem – a um Primeiro-Ministro que usou esquemas (para benefício próprio em detrimento do interesse público, de todos nós, que deveria defender e prosseguir) de uma sofisticação fraudulenta impressionante! Compreendemos, pois, que seja muito difícil para Mário Soares explicar esta sua admiração obsessiva por José Sócrates. Logo, Soares seguiu o caminho mais fácil: bater-se por José Sócrates até ao fim, com frases bombásticas como “não há democracia em Portugal” e que a culpa é sempre dos juízes. Claro!
4. Dito isto, convido o leitor a uma reflexão mais profunda e serena. Admitamos que, de facto, os juízes são condicionados pela política – e que há políticos que têm um ascendente sobre as decisões dos magistrados. Admitamos que sim. Pois bem, esse político, pela sua carreira longa na política e pelo prestígio que foi granjeando pela sua simpatia, só pode ser Mário Soares. E será que Mário Soares pode ter alguma relação com a detenção de José Sócrates?
5. Enfim, uma relação directa evidentemente não se poderá demonstrar. Mas Mário Soares foi – para estes juízes malvados e políticos –quem deu a ideia de deter José Sócrates. Porquê? Fácil.
6. Recuemos a Outubro do ano passado. O que disse Mário Soares? Que estes políticos são uns irresponsáveis, corruptos, criminosos. São todos uns garotos ignorantes e criminosos – avançava então Soares. Mais: Soares propunha uma solução para este problema – todos deveriam ser presos!
7. Ora, os juízes – que são políticos e muito admiram Mário Soares, acolhendo esta tese – decidiram seguir a doutrina Mário Soares. Os políticos ignorantes, garotos, irresponsáveis, que deviam ser presos – pois bem, prenderam José Sócrates. Aplicaram a sugestão dada por Mário Soares. Por conseguinte, não percebemos a irritação de Mário Soares pela detenção de Sócrates – foi o próprio Soares que inspirou tal detenção!
8. Dir-se-á: pois mas Mário Soares o que queria dizer é que deviam ser presos todos os políticos do PSD – só estes é que ignorantes. Os do PS são todos geniais e brilhantes e sérios. Tal como o próprio Mário Soares. Nada contra o PS, tudo pelo PS – eis o princípio democrático máximo para o patriarca socialista.
9. Enfim, Mário Soares queria os políticos na cadeia – Mário Soares tem políticos na cadeia. Os juízes seguiram a sugestão de Mário Soares. Soares só não conseguiu perceber que os juízes se poderiam enganar nos políticos – e prender os seus amigos políticos. Soares não se conforma por Portugal ser uma democracia – e não uma mário-soarocracia. Numa mário-soarocracia, Soares e os seus amigos teriam privilégios especiais – numa democracia, todos os cidadãos são iguais perante a lei. Mas Soares não é capaz de compreender este axioma essencial da nossa República.