2. Não consta que Pinto da Costa seja um grande amigo de José Sócrates. Nem consta que José Sócrates seja um fervoroso adepto do FC Porto – pelo contrário, sabemos que Sócrates é do Benfica. O que terá então levado Pinto da Costa a Évora para visitar Sócrates? A explicação é muito simples: fraternidade dos visados pelas escutas telefónicas que possibilitaram o “julgamento popular e mediático”. Pinto da Costa aproveitou aqui o momento e as circunstâncias para assumir uma posição pública de condenação da violação do segredo de justiça. E, com este acto singelo de se desocar ao estabelecimento prisional de Évora, Pinto da Costa conquistou para si uma parte da classe política, que agora, por mimetismo, o apoio na luta contra a Justiça.
3. E, a partir desse momento, verificou-se uma alteração na estratégia e no discurso do Porto. Até esse momento, Pinto da Costa, oficialmente, apresentava um discurso muito suave, face ao que era habitual, em relação à arbitragem. Quando falava, era subtilmente. Agora, se analisarmos bem, o Porto e a sua estrutura adoptaram uma estratégia coerente. O caso José Sócrates – e a solidariedade do Presidente com o ex-Primeiro-Ministro detido – permite apagar na memória colectiva as escutas do Apito Dourado. Mesmo sendo ilícitas a sua divulgação – e de acordo com o juiz, a sua captação (o que também não deixa de ser algo impressionante: então a investigação é mal feita e não há consequências? É o culto da irresponsabilidade…) – estamos com Sophia de Mello Breyner Andersen: vemos, ouvimos, lemos/não podemos ignorar”. E não podemos ignorar o que foi dito nas escutas. Passemos à frente.
4. Pinto da Costa precisa de acalmar os adeptos do Porto e uni-los contra um adversário comum – a arbitragem. Vendo o Benfica a uma distância de seis pontos, Pinto da Costa e a sua direcção têm de matar, na sua origem, qualquer foco de contestação: nada melhor, então, que dizer que o Benfica está à frente não por mérito próprio – mas sim devido à ajuda dos árbitros! Incluindo, até o treinador – o pobre Lopetegui, que os adeptos do Porto, como Manuel Serrão, gostam de chamar “Lotopegui” – nesta estratégia de lançar insinuações sobre a arbitragem e sobre um pretenso “sistema” hostil ao Porto (?) para esconder a incompetência própria! Evidentemente, esta estratégia acaba por criar um clima de pressão e de alguma auto-contenção aos árbitros que passam a ter mais cuidado nas decisões que possam afectar o clube do dragão. E vigorará o princípio in dubio contra o Benfica.
5. Pinto da Costa (e sua direcção) pretende, pois, criar instabilidade entre os árbitros e entre os jogadores e equipa do Sport Lisboa e Benfica. Devemos admitir que é uma estratégia legítima e inteligente de Pinto da Costa. O que prova a minha tese de que o futebol é política: as estratégias, os mecanismos de acção e o discurso são os mesmos da política, ou se preferirmos, das estruturas de poder. Qual é o problema? O problema é que o Benfica não reage politicamente. Parece que os responsáveis benfiquistas estão convencidos de que basta a equipa ir marcando uns golos, mantendo os 6 pontos e está tudo bem. Mas não: o Benfica para ser campeão não pode deixar o Porto a falar sozinho. Tem de reagir de forma eficaz e criativa. Por exemplo, achei piada ao cartaz dos adeptos do Porto com os roubos de catedral. Os adeptos do Benfica poderiam ter a mesma criatividade e fazer algo com piada: por exemplo, distribuir apitos da cor dourada ou um desenho enorme de um apito com algo a simular a talha dourada! Serei sempre contra a violência e a má educação no futebol. Sou a favor do entendimento e da civilidade no tratamento entre todos os clubes. Mas sou a favor das estratégias políticas no futebol. E o Benfica e o Presidente de grande nível que é Luís Filipe Vieira tem de pensar politicamente. E não deixar que a “estratégia José Sócrates” aplicada ao futebol resulte.