Socialistas do Sul em risco

As eleições gregas ditaram a queda de um Governo liderado pelo centro-direita da Nova Democracia (ND), mas a principal vítima da esquerda radical foi mesmo o Movimento Socialista Pan-Helénico (PASOK), que pela terceira vez consecutiva desde a ascensão do Syriza registou um mínimo histórico de apoio popular.

Socialistas do Sul em risco

De pouco mais de três milhões de votos em 2009, a última votação antes da entrada da troika no país, o PASOK viu-se reduzido a 289 mil na votação de 25 de Janeiro. Número que bateria os registos negativos de 2012 (833 mil votos em Maio, 756 mil em Junho) mesmo com os 152 mil votos recolhidos pelo Movimento dos Socialistas Democratas, criado no início do ano por dissidentes do PASOK liderados por George Papandreu, o último primeiro-ministro do partido.

O desgaste do poder foi um dos grandes responsáveis pela queda de vários governos de centro-esquerda na Europa desde o início da crise, nomeadamente entre os países mais afectados, como Portugal, Espanha e Grécia. O prolongar das dificuldades (e da austeridade imposta por Bruxelas) ameaça agora a sobrevivência dos respectivos partidos.

Se na Grécia o PASOK tem hoje menos votos do que o Syriza tinha antes da crise, o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) enfrenta uma ameaça semelhante. Quando chegou a casa depois de celebrar a vitória, Alexis Tsipras dedicou o seu primeiro tuíte ao movimento espanhol Podemos: “Primeiro tomamos Atenas, depois tomamos Madrid”, escreveu o novo PM grego, recuperando a música de Leonard Cohen, 'First We Take Manhattan'.

O movimento nascido das manifestações dos 'indignados' não é propriamente uma cópia do Syriza, nascido como plataforma comum para as várias sensibilidades da esquerda grega. Mas, apesar da menor organização política, conseguiu a proeza de em menos de um ano de vida se conseguir colocar nas sondagens a par dos dois partidos históricos de Espanha – o PSOE e o Partido Popular do primeiro-ministro Mariano Rajoy.

Uma espécie de empate técnico que esconde um cenário mais idêntico ao grego: na oposição desde 2011, o PSOE não consegue capitalizar o desgaste da austeridade de Rajoy, porque é precisamente aos socialistas que o Podemos está a roubar os votos.

O inquérito divulgado esta semana pelo estatal Centro de Investigações Sociológicas (CIS) coloca o Podemos em segundo lugar nas intenções de voto, com 23,9% contra 27,3% do PP e 22,2% do PSOE. Como sublinhava ontem o El País, é a primeira vez desde 1977, ano em que se iniciaram as sondagens do CIS, que o PSOE aparece na terceira posição entre os partidos espanhóis.

Carolina Bescansa, secretária de análise política e social do Podemos, disse ao mesmo diário que “a mudança política é irreversível e o sistema partidário nunca mais voltará a ser o que foi desde 1978”. A dirigente do partido liderado por Pablo Iglésias não esconde quem é o adversário na caça ao voto: “A única alternativa ao PP é o Podemos”, garante.

Deixar cair o socialista

Outrora pilares da defesa dos estados sociais europeus, os partidos socialistas do continente foram perdendo essa identidade à mesma velocidade com que as classes médias cresciam e os sindicatos perdiam peso nas sociedades europeias. O Partido Socialista italiano – ou a Federação Trabalhista, nome que adoptou depois de um escândalo de corrupção que dizimou a formação em 1994 – contornou o problema em 2007, juntando-se a uma coligação de partidos de esquerda que hoje ajudará a impedir a ascensão de fenómenos como o Syriza ou o Podemos. A táctica mostrou resultados quando o aparecimento do populista Movimento 5 Estrelas não impediu o Partido Democrático de chegar ao poder.

Em França, o actual primeiro-ministro tentou uma estratégia diferente. Manuel Valls candidatou-se à liderança dos socialistas em 2009 com propostas que incluíam o fim da semana laboral de 35 horas, a redução de ordenados como forma de aumentar a competitividade e a mudança do nome do partido, que na sua opinião devia abandonar a palavra 'socialista'. A ousadia fê-lo ficar-se pelos 6% mas após cinco anos de austeridade, o facto é que Valls é hoje muito mais popular entre o eleitorado do que o próprio Presidente. Apesar da resposta aos ataques terroristas de Paris ter dado um novo impulso à imagem de Hollande, as sondagens continuam a indicar que o primeiro-ministro tem mais hipóteses de vencer as próximas presidenciais contra um candidato da direita.

Que, tal como na Grécia, também pode pertencer a um partido não tradicional, desta feita com a extrema-direita de Marine Le Pen. Em Portugal, o partido irmão do Syriza parece ter atingido o auge cedo demais, sem a ajuda da crise, sendo agora Marinho e Pinto a principal ameaça à estrutura partidária tradicional, embora sem a mobilização de gregos e espanhóis.

nuno.e.lima@sol.pt