“É o meu primeiro contacto com a dança clássica, este universo que está entre o militar e o religioso”, explica Tiago Rodrigues, autor do texto e encenador. O desafio para se aproximar da Companhia Nacional de Bailado partiu de Luísa Taveira, a directora, e vinha com conceito: fazer um espectáculo para uma bailarina que já se tinha despedido dos palcos.
“Quando conheci a Barbora percebi que ela era em si uma metáfora. A história singular que representa a história universal. A obsessão, a repetição até à perfeição, o sacrifício de se moldar”. Ela que, sendo tão dedicada ao corpo como à paixão pela interpretação, podia levar para palco toda a vulnerabilidade da carreira terminada a par com a libertação “do corpo que já pode dançar na discoteca”.
O texto resultou de horas de entrevistas. “Parti dessa posição de leigo e o mais surpreendente continua a ser o chumbo que existe nos bastidores para se chegar àquela leveza de pluma no palco. Sentem dores mas são atletas de alta competição da beleza”.
Em António e Cleópatra, a encenação anterior, Tiago Rodrigues já tinha posto dois dançarinos a representar (Sofia Dias e Vítor Roriz). “Trabalhar a palavra com bailarinos é trabalhar num contexto de liberdade absoluta. Com a Barbora às vezes sente-se que está ali uma actriz que parece mesmo uma bailarina”. Também dança, claro, mas apenas variações das coreografias que apresentou na CNB. “É a memória do que estava gravado no corpo dela”.
No diálogo participa ainda Mário Laginha com o piano, a música original e um pouco mais: convertido no “afinador de pianos Siegfried” ajuda o “anticisne” a ser mais uma vez o cisne negro e a esticar um joelho que não estica.