Com tanta vontade de diálogo, Guterres colapsou e retirou-se precavidamente para não cair no pântano, enveredando por uma promissora carreira internacional ao abrigo da ONU, donde aparentemente não tenciona sair tão cedo.
Depois de tomar conta do PS, é a vez de António Costa tentar a sua sorte de putativo candidato a primeiro-ministro, escolhendo o terreno de campanha. E já se viu que o slogan é a anti-austeridade, alinhado com os seus irmãos espanhóis do PSOE e os gregos do Syriza e do Anel.
Desengravatado, correu ao encontro de Pedro Sánchez num fim-de-semana em Badajoz, depois de prefaciar o livro do veterano Felipe González, reaparecido das brumas ainda À Procura de Respostas.
Como não as encontra desde 1996, quando perdeu as eleições a favor dos conservadores do PP, González partilha agora com os mais novos as suas dúvidas metódicas.
Retirado da política activa, lançou este livro com um curioso neologismo para servir de mote à situação que prescruta na Europa, Grécia à cabeça: austericídio (ou o suicídio da austeridade)…
Mais prosaico, ou receando, talvez, que o conceito seja demasiado enigmático, Costa decalcou a ideia, sob o eufemismo de “austeridade expansionista”.
E foi nessa linha de pensamento que veio em socorro do périplo europeu do Syriza, com votos sentidos de que a Europa “não desperdice” o esforço do Governo grego, na meritória tentativa de convencer os parceiros a renovarem a confiança num poço sem fundo.
Claro que não lhe ocorreram os erros da desastrada governação dos socialistas do Pasok – que conduziram o partido ao afundamento nas últimas eleições -, nem as responsabilidades próprias e megalómanas dos governos do PS, que colocaram Portugal sob resgate.
É verdade que Costa nunca levantou um dedo para criticar o desnorte de Sócrates, preservando esse mutismo até no confronto com António José Seguro.
Desafortunadamente, desalojado o anterior líder, os fracos resultados das sondagens não lhe têm dado sossego e inquietam as hostes, a quem prometeu o regresso ao poder. Por isso, engrossou a voz, atrelado ao Syriza, e trazendo a reboque os órfãos dissidentes do Bloco.
Com alguma frieza e uma inesperada segurança, Passos Coelho tem vindo a mostrar que o país recuperou a confiança dos mercados, enquanto os indicadores económicos dão sinais de recuperação e o desemprego abranda.
Perante o volte-face dos números, Costa deixou cair na cimeira transfronteiriça algumas pérolas, conjecturando, por exemplo, que “Portugal e Espanha não sobrevivem fora da Europa”. Um achado.
Por acaso, essa separação imaginária da Península Ibérica já tinha sido tratada por Saramago, na Jangada de Pedra.
Porém, menos ficcional, no Verão quente de 75, chegou a temer-se que Portugal se transformasse na Cuba da Europa. Algo que Costa parece esquecer, ao aliar-se aos radicais, sonhando com uma maioria de esquerda. Errático, sem bússola, a deriva continua…