Autor de um conjunto de ensaios – que deu origem à obra ‘Herberto Helder: Um Silêncio de Bronze’ – Frias Martins explicou ao SOL o porquê deste poeta “ser um daqueles autores que nos prendem sem remissão se os lemos naquele período da nossa juventude em que valores, gostos e normas estão em processo de definição”.
“Se estivermos disponíveis para a jovialidade da ruptura durante esses anos de formação — que eu situaria entre os dezoito e os vinte e cinco anos de idade, tendo em conta a especificidade da escrita herbertiana e sobretudo a minha experiência dela–, há algo neste escritor que nos entra na pele, na imaginação, nos anseios de vida intelectual que, pela afinidade do tempo e dos ideais, partilhamos em euforia com amigos ou companheiros”, explicou ao SOL.
Trinta e dois anos após a publicação de ‘Herberto Helder: Um Silêncio de Bronze’, o ensaísta relembra uma das definições de ‘clássico’ dada por Italo Calvino para explicar “o conforto” que a obra do poeta lhe dava no início da sua formação intelectual: “O nosso clássico é o que não pode ser-nos indiferente e que nos serve para nos definirmos a nós mesmos em relação e se calhar em contraste com ele”.
“A obra herbertiana continua a solicitar-me uma definição de mim mesmo, assegurando-me sem sombra de dúvida que ela é indiscutivelmente um dos meus clássicos. É, por isso, com a displicente curiosidade de um também futuro inquilino da região desconhecida que eu espero que os leitores do tempo por vir sintam necessidade da obra herbertiana como eu senti enquanto habitei a vida conhecida e a sua literatura. "Eu sou feliz. Durmo na obra", lê-se num dos poemas de Herberto Helder. Sim, é isso mesmo, o poeta que admiramos não morreu, está só a dormir na obra….!”, conclui Manuel Frias Martins.
Uma relação ‘respeitosa e distante’
Para o poeta e escritor José Jorge Letria este é “um dia muito triste”, pois perdeu-se “um dos maiores nomes da poesia europeia”.
“A morte de Herberto Helder é sem dúvida uma das maiores perdas na cultura portuguesa e da literatura em particular”, disse ao SOL.
José Jorge Letria recorda os tempos em que conheceu o poeta, uma figura que admirava e com quem mantinha uma “relação respeitosa e distante”, já que o próprio Herberto Helder “não gostava de misturas e diálogos, era a forma que tinha de defender a sua obra”, explicou.
“Quando era vereador em Cascais – a minha terra e a terra que Herberto Helder escolheu para viver – ele queixava-se do barulho que faziam num estabelecimento que se encontra por baixo da casa onde vivia. A Câmara andou à procura de algumas soluções, mas acabou por não ser necessário haver uma intervenção". Depois de tudo estar resolvido, José Jorge Letria quis organizar um encontro literário em homenagem ao poeta, "mas foi o próprio que me pediu para não o fazer”, relembra o escritor.
“Herberto Helder foi uma das vozes mais marcantes da nossa cultura (…) A sua partida encerra um capítulo da literatura portuguesa”, concluiu.