Rodrigo Leão: ‘É possível identificar o meu som’

A Vida Secreta das Máquinas explora um lado mais electrónico e ambiental na música de Rodrigo Leão.

'A Vida Secreta das Máquinas' nasceu numa viagem a Goa?

Sim, as primeiras ideias, mas na altura não me passava pela cabeça fazer um disco. Estava a visitar uma casa muito velha e achei interessante alguns ruídos de uma instalação eléctrica. Gravei com o telemóvel e, uns meses depois, quando comecei a compor temas novos, lembrei-me que tinha esses ruídos e que podiam dar textura a alguns temas ambientais para não ficarem tão limpinhos.

Daí este título meio fantasioso?

Quis ter esse lado de fantasia, como se as máquinas tivessem uma alma, uma vida própria, mas da qual não nos apercebêssemos.

Gravar ruídos na rua é um hábito?

Faço isso esporadicamente. Já tinha acontecido antes. Em A Mãe utilizei sons de pássaros e pessoas na rua, mas nunca ando propositadamente a captar coisas para canções. Tem acontecido tudo de forma muito natural. Este disco, por exemplo, surgiu porque um grande amigo estava a preparar a primeira edição do Lisb/On #JardimSonoro e desafiou-me a fazer um espectáculo com as ideias que ia ouvindo aqui em casa. Preparei um concerto de 40 minutos, mas depois soube-me a pouco e achei que fazia sentido ter uma edição física.

Tem dito que é um disco à parte da sua restante obra. Porquê?

É a minha aproximação, um pouco tímida, à música electrónica. Não sou entendido na música que se faz actualmente, mas estava interessado em ter um lado de electrónica e ambiental mais presente. Ainda assim, acho que as pessoas reconhecem que sou eu. Só há um tema, '136', assumidamente de dança.

Preocupa-o estar actualizado com as novas tendências musicais?

Não é coisa que me aflija muito. Sou autodidacta, não sei escrever música, mas vou fazendo a minha com trabalho e dedicação. Actualmente estou a preparar o meu próximo disco, que deverá sair em Novembro, e já tenho outro terminado, com o Scott Matthew, que só vai sair daqui a um ano.

Está sempre a compor?

Nem por isso, estes últimos dois anos é que têm sido muito produtivos. Depois 'compenso' com anos em que não faço nada (risos).

Mas é um exercício diário?

Não. Também é importante ter algum distanciamento para se amadurecerem ideias e se perceber quais os temas que, depois de dois meses sem os ouvirmos, continuamos a gostar muito.

Há dois anos assinou a banda sonora de 'O Mordomo' e escreveu-se que as portas de Hollywood estavam abertas para si…

Pareceu-me sempre tudo muito exagerado. Gostei de trabalhar no filme, mas já se passaram dois anos e não surgiu mais nenhum convite. Ainda bem que nunca me convenci que ia passar a ter muitos convites. Mas acabei agora de compor para uma exposição que vai inaugurar no Oceanário de Lisboa, que se chama 'Florestas Submersas' e é da autoria do artista japonês Takashi Amano. É um aquário que em vez de peixes tem plantas e eu fiz um tema de 13 minutos que acompanha a exposição toda. É uma música que penso que as pessoas reconhecem como minha.

Diz várias vezes isso. Ao fim destes anos todos de carreira acredita que criou o seu som?

Eventualmente. Há muitas pessoas que me dizem isso. E há, de facto, coisas que se têm mantido intactas ao longo destes 33 anos, desde o início dos Sétima Legião, passando pelos Madredeus. Aquele lado mais melancólico que existe na música que faço, aqueles acordes, aquelas melodias de violino. Por isso, penso que é possível identificar um som meu, mesmo que o tenha feito com influências de muitas outras correntes musicais.

alexandra.ho@sol.pt