O PE é um reporte obrigatório a Bruxelas com as perspectivas orçamentais de médio prazo. As linhas gerais devem ser conhecidas esta semana. O documento terá de conter, além de novas previsões económicas, medidas concretas para corrigir desvios nas contas públicas. O último compromisso de Portugal é atingir um défice de 1,5% em 2016, face aos 2,7% este ano.
Em entrevista ao SOL na última edição, a ministra das Finanças adiantou que a reversão dos cortes salariais e da sobretaxa de IRS será avaliada no PE, «em função do espaço orçamental».
Margem é reduzida
O Ministério das Finanças começou esta semana a trabalhar no documento. Segundo o deputado do PSD Duarte Pacheco, a discussão em Conselho de Ministros poderá ocorrer já na próxima semana.
Os economistas contactados pelo SOL antecipam que o Governo tenha margem reduzida para eliminar completamente as medidas de contenção orçamental. «O mais razoável seria a manutenção da trajectória de devolução lenta dos cortes sobre os vencimentos», considera Paula Gonçalves Carvalho, directora de estudos económicos do BPI.
O fantasma do TC
Pedro Afonso Fernandes, economista-chefe do Necep, o gabinete de estudos da Católica, antecipa que haja «pouca margem de manobra para diminuir o esforço de consolidação». Face a uma «passividade orçamental» do Governo este ano, haverá uma «elevada probabilidade» de um «ajustamento orçamental forte nos primeiros anos da próxima legislatura».
Paula Gonçalves Carvalho sugere uma solução em que a reversão dos cortes salariais e da sobretaxa estaria dependente de se alcançar um determinado crescimento nominal do PIB. «As medidas a anunciar não deverão pôr em causa a trajectória de consolidação orçamental. Há que agir de forma muito gradual na devolução dos cortes de salários e no relaxamento da carga fiscal», explica.
Mas as decisões orçamentais tornam-se mais complexas devido ao fantasma do Tribunal Constitucional (TC), que vai aparecer de novo nas medidas para 2016 e pressiona uma devolução completa dos salários. No ano passado, os juízes aceitaram cortes para 2014 e 2015, mas chumbaram a proposta de uma reposição progressiva entre 2016 e 2018, a definir anualmente.
O Governo está assim numa encruzilhada em que tem de decidir entre o esforço orçamental pedido pelos economistas e o cumprimento das determinações do TC. No ano passado, quando discutiu o Orçamento do Estado no Parlamento, o primeiro-ministro admitiu insistir na devolução parcial de vencimentos, mesmo que tal fosse contra os juízes do Palácio Ratton. Na entrevista ao SOL, a ministra não se comprometeu com essa solução.
Eleições pressionam
O PE a divulgar este mês revela-se particularmente delicado ainda por outra razão: os cortes e a sobretaxa não são as únicas medidas temporárias com efeitos em 2016. São as mais pesadas, implicando um esforço conjunto de 1.500 milhões de euros.
Mas há outras com impactos não negligenciáveis: a sobretaxa energética, a contribuição dos bancos, os cortes nas reformas mais altas, as actualizações automáticas de pensões e o trabalho extra no Estado.
O calendário eleitoral é outra fonte de pressão. Com legislativas em Setembro ou Outubro – Cavaco Silva ainda não anunciou a data – o documento irá sinalizar as medidas com as quais o PSD e o CDS poderão comprometer-se na campanha eleitoral.
O Conselho de Finanças Públicas já deixou avisos. Simulou cenários sem a sobretaxa de IRS e com reposição total das remunerações da função pública. «Sob estas hipóteses, a partir de 2016 o défice orçamental situar-se-á acima do limiar de 3% do PIB definido no protocolo anexo ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia», alertou o organismo liderado por Teodora Cardoso.
Mesmo que as perspectivas macroeconómicas sejam hoje mais positivas do que quando foi apresentando o OE, em Outubro, a margem é estreita. «Tornaram-se já evidentes algumas pressões sobre a despesa, designadamente nos custos com pessoal. E as prestações sociais mantiveram uma tendência crescente nos últimos anos não obstante todos os esforços de contenção», diz Paula Gonçalves Carvalho.
Sete medidas temporárias ameaçam o défice de 2016
joao.madeira@sol.pt