Mas as suas críticas ajustam-se hoje perfeitamente aos populismos europeus – que se têm vindo a multiplicar à sombra da crise.
Para Alvarez, a grande clivagem do nosso tempo não é entre 'esquerda e direita', mas entre 'populismo e república'.
Aproveitando-se das dificuldades e do desespero das pessoas, os populistas ganham o poder fazendo promessas impossíveis – e a partir daí dedicam-se a destruir as instituições republicanas, tentando depois impor novos totalitarismos.
O populismo não é de esquerda nem de direita – há populistas de todas as ideologias.
Isso observa-se, aliás, na Grécia, onde a extrema-esquerda e parte da extrema-direita se aliaram para formar Governo, substituindo os partidos moderados.
E são reveladores os elogios que Marine Le Pen, líder da extrema-direita francesa, faz ao primeiro-ministro esquerdista grego Alexis Tsipras.
Nesta perspectiva, a satisfação que António Costa mostrou pela vitória do Syriza nas eleições gregas constituiu talvez o seu maior erro político, revelador de uma inesperada falta de consistência ideológica.
António Costa não percebeu logo a ameaça que a vitória do populismo representava para as instituições democráticas (ou republicanas, como diz Gloria Alvarez).
Não percebeu que essa vitória funcionava contra ele, ou seja, funcionava contra os partidos moderados – e, em particular, contra os partidos socialistas e sociais-democratas.
Também foi doloroso ver Mário Soares, um dos 'pais' do socialismo democrático, que em 1975 lutou em Portugal contra o radicalismo comunista, aplaudir entusiasticamente esses populistas gregos que desdenham o socialismo democrático.
Na Grécia, os populistas aproveitaram-se da crise para aliciar as pessoas, mas agora não conseguem cumprir as promessas que fizeram – pela simples razão de que não sabem o que fazer com o poder.
Os primeiros meses de governo do Syriza são bem demonstrativos desta verdade.
Na Europa, ninguém percebe o que eles querem, ninguém entende as suas propostas – e suspeita-se que eles próprios também não.
Em Portugal, a par do Bloco de Esquerda e de uma nuvem de pequenos partidos e movimentos resultantes de sucessivas cisões, também surgiram algumas figuras que fazem do populismo a sua forma de afirmação política.
Paulo Morais e Marinho e Pinto, mas também Sampaio da Nóvoa (numa versão académica) e Henrique Neto (numa versão empresarial) são exemplos de personalidades populistas.
Basicamente, o seu papel resume-se a denegrir as instituições.
Dizem mal dos políticos que existem, atacam os partidos que existem, deitam abaixo o sistema que existe.
Afirmam querer 'regenerar' o sistema democrático.
Mas regenerar como?
Acabando com estes partidos e promovendo a criação de outros?
Correndo com estes políticos e inventando outros?
Destruindo estas instituições e fundando outras?
Será que a vaidade destes D. Sebastiões chega ao ponto de acreditarem que podem fazer tudo isso?
Os partidos populistas que têm surgido na Europa Ocidental com uma expressão razoável – o Syriza, na Grécia, o Podemos, em Espanha, ou a Front National, em França – são hoje o grande perigo que ameaça as democracias.
Os seus líderes tentam os eleitores como a serpente tentou Eva – e estes, incautos ou desesperados, vão atrás.
Mas, como esses partidos não têm projectos exequíveis em democracia, o seu único objectivo acaba por ser derrubar as instituições existentes – e depois logo se vê…
É este o 'programa' dos populistas.
Que está perfeitamente claro, por exemplo, no livro de Pablo Iglesias Disputar a Democracia, agora publicado em Portugal.
Não há nenhuma ideia estruturada para lá da destruição deste modelo de sociedade.
Ora, as instituições que temos não são perfeitas – mas deram muito trabalho a construir.
E em nenhuma parte do mundo o seu derrube conduziu a uma sociedade melhor.
Assim, o caminho certo não é desacreditar as instituições e reduzi-las a escombros – mas sim aperfeiçoá-las.
Não é destruir o sistema – mas sim melhorá-lo.
Os que, em nome de uma melhor democracia, de uma maior participação das pessoas, de uma mais perfeita representação do povo, se propõem deitar fora as actuais instituições, apenas querem uma coisa: alçar-se ao poder para depois governarem sem o controlo de ninguém.
Livremo-nos deles!
P.S. – Marcelo Rebelo de Sousa dizia há uns dois meses, no seu habitual comentário, que António Costa estava a gerir “magistralmente” (sic) a questão dos candidatos presidenciais, enquanto Passos Coelho só cometia erros. Tem-se visto…