Punk português é a música do ‘refluxo’ do 25 de Abril

A cena punk portuguesa tem sido objecto de estudo nos últimos anos e é agora tema do livro “As Palavras do Punk”, sendo, para um dos autores, a música do “refluxo da revolução” de 1974.  

Em entrevista à Lusa, o sociólogo – e um dos autores do livro – Augusto Santos Silva lembrou que "o punk português não é a música da revolução (essa é a canção de intervenção), o punk português é a música do refluxo da revolução". 

"As Palavras do Punk", da autoria de Paula Guerra e Santos Silva, vai ser apresentado na segunda-feira no Porto e em Lisboa no dia 12 deste mês, pretendendo oferecer "o panorama contemporâneo das bandas punk em Portugal" através de entrevistas com 214 protagonistas do punk nacional e da análise de conteúdo de múltiplos documentos como letras, capas de discos, 'fanzines' ou até mesmo do nome das próprias bandas.

A investigação levou ao recenseamento de mais de 700 bandas, desde o momento de início desta subcultura no final dos anos 1970, havendo, segundo os autores, mais de 300 em actividade na actualidade, em todo o continente e nas Regiões Autónomas.

No livro é feita também uma caracterização do punk em Portugal, desde o seu posicionamento como "um dos caminhos de evolução e de transformação da música popular contemporânea" ao modo de produção autónoma denominado do DIY ('do-it-yourself, em inglês, que se traduz por 'faz tu mesmo'), passando pelo facto de ser uma "mundividência e um modo de vida" e de incluir componentes expressionistas e até existencialistas.

Santos Silva referiu que o livro aborda ainda duas questões "em que o punk é mais problematizado ou problematizável": "para uma subcultura que tão radicalmente encarna a ideia de que não deve haver poderes, não deve haver sistema, deve haver igualdade, deve haver liberdade, é muito perturbadora a força com que, por um lado, a violência pode discursivamente ser usada e sobretudo a questão do género".

"O punk, como aliás o geral do rock, é um universo de enorme poder masculino e de enorme dominação masculina por qualquer critério que se utilize", afirmou o professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto. 

Em termos de evolução espacial, Paula Guerra recordou que, no começo do punk em Portugal, "as coisas estavam confinadas a Lisboa e um pouco a Almada", para, na década de 1980, se começar a estender a mais partes do país.

"Nos anos 1990 as coisas foram-se estendendo, a Leiria, Castelo Branco, ou mesmo a Braga. Até que hoje há uma presença em todo o território. Há muita coisa em Lisboa, mas há uma espacialização das bandas que se dizem punks ou se reportam a alguma coisa dos subgéneros que podemos encaixar dentro do punk", explicou a professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, responsável pelo projecto "Keep it simple, make it fast! Prolegómenos e cenas punk, um caminho para a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)".

Lusa/SOL