De comida de cabras a moda europeia

Reza a lenda que certo dia um pastor da Abissínia (actual Etiópia) reparou que, depois de terem comido as bagas de uma planta, as suas cabras ficavam muito agitadas. Intrigado, o pastor levou as bagas a um mosteiro. Os monges analisaram-nas, usaram-nas para preparar uma bebida e descobriram que, após ingeri-la, também eles ficavam mais…

Cultivado no Iémen desde o século VI, o café dissemina-se por outros pontos do Médio Oriente e Norte de África. Em 1538, o porto de Moca, no Iémen, o mais importante mercado de café do mundo entre os séculos XV e XVII (e que dá nome a uma variedade nobre de café arábica), é tomado pelos otomanos.

A bebida chega a Veneza ainda na primeira metade do século XVII (o famoso Florian abre mais tarde, em 1720) e a Paris em 1669, onde é lançada na moda pela embaixada turca, que todos observam com grande curiosidade. Os primeiros estabelecimentos que servem a bebida já preparada pertencem a arménios, no entanto é o siciliano Procoppio quem se destaca. Começa como vendedor ambulante e abre o seu primeiro estabelecimento em 1686. Depois transfere-se para um elegante espaço na vizinhança da Comédie Française, que lhe trará muita clientela.

Além de introduzirem o café em Veneza e Paris, os otomanos levam-no também a Viena, quando cercam a cidade em 1683. Na capital da Áustria, os cafés tornam-se daí em diante centros da vida intelectual e artística, sendo ainda hoje locais de culto.

No século XVIII a planta do café viaja para outras paragens: as colónias francesas da Martinica, Guadalupe e Guiana. O pequeno-almoço à parisiense, café com leite açucarado, torna-se moda por toda a Europa.

Mas, por onde passa, o café também suscita desconfiança. Os cafés são locais de má fama, onde se fuma e se joga. Em 1633, o sultão Murad IV emite um decreto que obriga ao encerramento de todos os cafés de Constantinopla e que condena à morte por afogamento quem for apanhado a bebê-lo… Na Europa, ainda no século XVIII muitos médicos acreditam que a sua ingestão torna os homens incapazes de procriar.

jose.c.saraiva@sol.pt