Cuba recebe amore do Vaticano e amour de Paris

A dias de sair da lista negra norte-americana de Estados que patrocinam o terrorismo, Cuba prepara-se para nomear representantes diplomáticos nos EUA, como explicou o Presidente Raúl Castro na terça-feira, após despedir-se do homólogo francês que visitou a ilha. Além do encontro com François Hollande em Havana, Castro teve uma agenda recheada: no sábado não…

Depois de mais de 50 anos de embargo comercial imposto pelos EUA, o muro de isolamento que cerca a ilha dá sinais de se esboroar. Desde o anúncio, em Dezembro, do retomar de relações diplomáticas entre Washington e Havana – um processo mediado pelo Papa Francisco -, houve o encontro em Abril da cimeira das Américas, no Panamá, com o histórico aperto de mão de Raúl Castro e Barack Obama. Foi também em Abril que o PR norte-americano anunciou que retiraria Cuba da lista de países que financiam o terrorismo – em que permanecia desde 1982. A medida formaliza-se no dia 29.

Histórica foi também a visita do Presidente ao Vaticano. Castro voou até Moscovo para assistir no sábado às comemorações dos 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial – Cuba não podia recusar o convite do antigo aliado soviético -, mas depressa seguiu para o Ocidente e para o coração do catolicismo. 

No encontro de domingo com o pontífice, o líder cubano prometeu que, quando o Papa visitar a ilha em Setembro, estará presente «em todas as missas que ele celebrar, e com satisfação». E reconheceu: «Pertenço ao Partido Comunista Cubano, que não permitia crentes, mas agora admitimos, é um passo importante». 

30 horas 'históricas'
Segunda-feira, Raúl Castro estava já no seu país para receber a primeira visita de François Hollande à ilha. O PR francês foi também o primeiro chefe de Estado europeu a deslocar-se ao arquipélago desde o anúncio de Dezembro (e o primeiro gaulês naquele cargo a fazê-lo desde a independência de Cuba, há mais de cem anos).

Hollande qualificou as 30 horas de visita como «históricas». Conseguiu encaixar na agenda um encontro de cerca de uma hora com Fidel Castro. O líder revolucionário, de 88 anos, que raras vezes aparece em público ou se deixa fotografar, causou forte impressão em Hollande, que admitiu ter ficado «surpreendido, no melhor sentido da palavra».

Clima, acesso à água e alimentação foram temas da conversa, que indispôs dissidentes cubanos e parte da comunidade francesa que reside na ilha. Num encontro com compatriotas em Havana, o Presidente gaulês defendeu-se, como relatou o Libération: «Tinha à minha frente um homem que fez a História. Fidel Castro é a História de Cuba, a História do mundo», e também uma história de interdição de partidos políticos, uma história de ausência de abertura política, que o próprio Hollande criticou em 2003 num artigo publicado no Nouvel Observateur, em que se insurgiu contra a «ditadura» na ilha.

Agora, apelando ao fim do embargo – a França fará o que puder «para acabar com as medidas que tão seriamente comprometeram o desenvolvimento cubano» -, o gaulês aproveitou para estreitar laços económicos: foi anunciado um acordo entre a petrolífera estatal CubaPetroleo e a francesa Total, para exploração offshore no Golfo do México.

Cuba abre-se lentamente ao mundo de novos negócios, com novos parceiros. Várias empresas já obtiveram licença para operar rotas de ferries entre a ilha e os EUA (cerca de 150 km separam Cuba da Florida), que deverão estar em funcionamento em Setembro, segundo a BBC. E desde Março que um voo charter liga Nova Iorque e Havana. O último reduto da Guerra Fria no hemisfério ocidental tem os dias contados.