Como já tive oportunidade de referir, neste campo da fiscalidade o recurso às novas tecnologias de informação e comunicação nem sempre é opção que vise simplificar as obrigações fiscais dos cidadãos, sendo muitas vezes um meio que complica e até assusta, sem que tal garanta os objectivos que supostamente estarão subjacentes, ou seja, uma justa e mais eficaz cobrança de impostos. Os excessos – mesmo de zelo – não são necessariamente positivos.
A obrigação de emitir recibos por via electrónica nos contratos de arrendamento urbano, sob pena de pesadas penalizações entretanto suspensas, é um exemplo desse zelo fundamentalista que está longe de ser uma medida positiva para o sector imobiliário, tendo até consequências potencialmente muito negativas caso o próprio diploma não venha a ser revisto, como ainda não foi, apesar da suspensão da aplicação das sanções entretanto decretada, numa reacção aos reparos que muitos sectores têm levantado.
Eu recordo, por exemplo, que para a mediação imobiliária poder continuar a gerir arrendamentos urbanos, servindo clientes como os emigrantes, os proprietários de imóveis colocados no mercado de arrendamento terão de autorizar os gestores a emitir recibos, situação que na esmagadora maioria dos casos implica a improvável cedência do login e da password de acesso aos respectivos sítios no portal das finanças. Por razões análogas foi suspenso o serviço de uma associação de defesa de consumidores que ajudava contribuintes a preencher o IRS.
Ainda nesta linha de raciocínio, deve voltar a sublinhar que a gestão profissional dos arrendamentos urbanos, garantida pelas empresas de mediação imobiliária, tem sido uma reconhecida via de incentivo ao funcionamento do mercado de arrendamento urbano. Dificultá-la, mesmo que indirectamente, é um risco acrescido e injustificado se os potenciais ganhos que levam a impor as novas regras forem, como facilmente se adivinha, inferiores ao que farão perder.
Registo a decisão do Governo de alargar o prazo para a entrada em vigor da emissão electrónica de recibos do arrendamento urbano, mas lembro que esta decisão apenas adia no tempo uma opção que continua a acentuar um clima de desconfiança por parte de algumas autoridades tributárias relativamente aos contribuintes, numa assustadora filosofia de exercício dos poderes conferidos às instituições que devem gerir o Estado, que em nada favorece o relacionamento dos cidadãos com os poderes.
O tempo ganho com esta abertura do Governo deve ser utilizado para um debate sério sobre estas questões, debate que inevitavelmente, na minha perspectiva, levará à alteração destas regras.
*Presidente da APEMIP, assina esta coluna semanalmente