Alterações climáticas e sustentabilidade em programa de doutoramento no ICS

Luísa Schmidt, socióloga e investigadora, coordena o doutoramento no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Em entrevista, apresenta o programa iniciado em 2009 por três Universidades de Lisboa, as então Clássica, Técnica e Nova, que tem a sua 6.ª edição a decorrer no Instituto a que está ligada.

Como define as características marcantes deste doutoramento no Instituto de Ciências Sociais?

O doutoramento em "Alterações Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável" é um programa simultaneamente internacional, interinstitucional, interdisciplinar e intergeracional.

Um doutoramento internacional, em primeiro lugar pela temática.

O tema das alterações climáticas, que têm dimensão simultaneamente local e global, já está em todas as agendas, desde a economia à política – está presente até na agenda do Papa – marca e é para ficar na agenda internacional.

Já no início de Dezembro, e no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas – a primeira tentativa da comunidade internacional para entender e enfrentar o problema – Paris vai receber a chamada COP 21, ou seja, 21ª Conferência das Partes.

Deposito grandes esperanças nessa cimeira internacional e, antes, nós vamos organizar aqui em Portugal uma Conferência com os restantes países lusófonos para preparar uma tomada de posição conjunta.

Em segundo lugar este doutoramento é internacional porque, por um lado, foram estabelecidas parcerias com outras universidades estrangeiras e, por outro, é frequentado por alunos de várias nacionalidades, muito virado para os países de língua portuguesa.

Além dos portugueses, claro, temos muitos alunos brasileiros, quase metade da turma, da Guiné-Bissau, Moçambique, Cabo Verde e Angola. À margem, aproveito para deixar aqui nota que uma das dificuldades que enfrentamos é a dos vistos que têm de ser pedidos com muita antecedência para não acontecer o que já aconteceu com alunos angolanos e moçambicanos: quando conseguem obter o seu visto já se passaram seis meses sobre a data de início do curso, o que os obriga a, findo o segundo, ter de voltar ao semestre inicial.

O doutoramento é, em segundo lugar, interinstitucional.

Foi criado por três universidades portuguesas, a Universidade Nova e as antigas Técnica e Clássica, agora reunidas numa só, a Universidade de Lisboa, que estabeleceram parcerias com suas congéneres: a universidade de East Anglia, de Norwich, no Reino Unido, o Instituto de Potsdam, em Berlim, a USP, de São Paulo e a UFRJ, do Rio de Janeiro, o que acabou por trazer bastantes vantagens para os alunos, que podem circular entre elas.

Beneficiam também, por sermos um dos doutoramentos FCT, Fundação para a Ciência e a Tecnologia, das 36 bolsas que ganhámos, o que lhes permite estarem fora durante uns meses. E uns decidem mesmo, depois, ficar lá um, dois anos.

Porque tanto o tema das alterações climáticas como o do desenvolvimento sustentável têm, obrigatoriamente, de ser abordados de pontos de vista diferentes, o programa é, ainda, interdisciplinar.

Assim, os nossos alunos vêm de diversas proveniências: Ciências Sociais e Humanas como o Direito e a Economia, Engenharia, Biologia, Arquitectura…

Temos por isso dois semestres preenchidos com aulas porque, sendo o tema interdisciplinar e transversal, a componente lectiva tem de ter muito peso. Os formandos têm de o abordar de diversas perspectivas: a da História, da Geografia, Sociologia, Engenharia, Economia, Climatologia, etc.

Finalmente, este doutoramento também acaba por ser intergeracional.

Não só porque as alterações climáticas afectam o nosso presente e o das gerações futuras, mas ainda porque a par de alunas e alunos acabados de sair da universidade temos aqui, por exemplo, dois militares do exército brasileiro.

As ligações internacionais e intergeracionais tornam o curso extremamente interessante porque a diversidade é sempre boa conselheira, não só da natureza, como das pessoas, também.

Outra das características que devo referir é que o curso integra, muitas vezes, os doutorandos na investigação que nós fazemos em projectos a que concorremos em conjunto com outras universidades.

 

Que resultados pode já apresentar desta e das cinco edições anteriores do programa?

É agora que estão a aparecer os frutos do investimento que fizemos. Como sabe as teses de doutoramento demoram sempre cinco, no mínimo quatro anos, a serem concluídas. Com alguns já finalizados estamos em vias de atingir a dezena de doutorados e há outros que estão a acabar o seu percurso. Agora por exemplo, temos uma das nossas alunas a finalizar a sua tese em Moçambique.

 

A mais valia deste programa esgota-se no mundo académico?

Não. Temos aqui o clássico aluno que sai da universidade, mas estamos abertos à sociedade, ou seja, também captamos alunos que estão no Estado e nas empresas. Têm já uma carreira e com este programa ficam nas mãos com uma série de conhecimentos e ferramentas que podem depois aplicar na sua vida profissional.

Cito, por exemplo, o caso de quadros com cargos de responsabilidade na EPAL, na REN – Rede Eléctrica Nacional, na Inspecção do Ambiente ou ainda a CEO de uma multinacional da publicidade que por aqui passou, o que lhe permitiu depois desenvolver para os clientes da sua agência uma série de campanhas ligadas ao tema da sustentabilidade.

 

E ao conjunto da sociedades que contributos traz este doutoramento?

Obriga-nos a pensar em todas essas dimensões as transformações por que estamos a passar, não só as que estamos a sofrer como também aquelas que estamos a provocar.

A algumas temos de nos adaptar e outras devemos mitigar e combater.

Em primeiro lugar temos de nos adaptar às alterações climáticas. Foi esta a mensagem aos países e aos povos que saiu da Cimeira de Copenhaga 2009.

Isso implica, em primeiro lugar, estarmos atentos à subida do nível médio do mar, à erosão costeira, à seca, às cheias, às ondas de calor e de frio, todo um conjunto de fenómenos, alguns extremos, que vieram para ficar.

Todos os estudos mostram que as populações menos informadas, mais desprevenidas e socialmente mais desfavorecidas são aquelas que mais sofrem. Uma mesma catástrofe num país preparado e noutro menos preparado tem consequências materiais e humanas completamente diferentes.

Temos ainda de mitigar todos e combater as acções que agravam os efeitos negativos das alterações climáticas e põem em causa o desenvolvimento sustentável, como, para citar apenas alguns, os desperdícios de energia e água e hábitos ligados utilização dos carros, que temos de alterar.