Lola Benvenutti foi o nome que Gabriela Natalia da Silva escolheu quando se iniciou no mundo da prostituição. As primeiras experiências, levou-as a cabo no último ano de faculdade, quando estava a terminar a licenciatura em Letras na Universidade Federal de São Carlos. Foi também aí que nasceu o blogue que é hoje um dos mais lidos no Brasil. Apaixonada por literatura, explica que o nome surge da leitura de Lolita, de Vladimir Nakobov: “Tinha lido esse livro e achei perfeito por causa dessa coisa da sexualidade de uma menina muito jovem com um homem mais velho… É um alter-ego. No fundo, a Lola é uma Gabriela hiper-sexualizada”, explica à Tabu.
No início, os encontros com pessoas que ia conhecendo na internet não passavam de “uma brincadeira”. “Achava divertido sair com os caras e conhecer gente na internet. E passei a cobrar muito naturalmente. Eu queria saber se eu tinha esse nível de poder com os homens. Aí, quando eles pagavam, eu pensei: ‘Caramba, eu transo e ainda me pagam!’”.
Do anonimato ao escândalo
Curiosa e obstinada, Lola não tardou em assumir a nova profissão, numa altura em que ainda estava integrada em projectos da faculdade. Desistiu da carreira recente de professora e mudou-se para São Paulo. Foi uma entrevista ao G1, portal de notícias da Globo, que a lançou para a fama. “Ficou o Brasil inteiro me ligando. Nunca mais meu telemóvel parou de tocar!”.
Contava, assim, ao mundo que a prostituição tinha sido “uma escolha” e que o “fazia porque gostava”, com uma naturalidade que escandalizou muita gente. “No começo foi bem difícil. As pessoas falavam que eu só queria dinheiro, outros diziam que não passava de marketing…”.
Gabriela admite que nem tudo foi positivo: “O difícil não era o transar com as pessoas. Era a violência social”. Enfrentou de tudo um pouco, desde tentarem expulsá-la de um bar que frequentava regularmente em lazer – “e nunca em trabalho” – até ver que alguém riscara a pintura do carro que comprara recentemente com a seguinte frase: ‘Você dormiu com o meu marido’.
Hoje recebe constantemente mensagens com pedido de dicas e conselhos sobre sexo. À entrevista para a Globo seguiram-se muitas outras, algumas delas conduzidas pelos maiores comunicadores do Brasil, como Marília Gabriela e Jô Soares. Quase todos lhe perguntaram como preferia que se referissem à sua profissão. A resposta foi descarada, como sempre. “Quando estou preenchendo uma ficha e me perguntam qual é a minha profissão, eu tenho vontade de escrever ‘puta aposentada’ só para ver a cara da pessoa. Não tenho de pedir desculpas à sociedade por ser quem sou”, declara à Tabu.
Lola agitara de tal forma o país que já não se limitava a ser profissional do sexo. “Passei a ser mais que uma puta. Era uma empresa”. Por isso, viu-se inclusivamente forçada a contratar uma equipa, constituída por um segurança e uma gestora do blogue.
Em O Prazer é Todo Nosso – editado em Portugal em Março último, pela Guerra e Paz – Lola relata episódios reais de BDSM e ménage à trois que viveu tanto com homens como com mulheres, sem qualquer tipo de pudor nem arrependimento, e descreve as situações que mais a surpreenderam. A prostituição, diz, foi uma maneira importante de conhecer a humanidade. “Vi muita tristeza, sofrimento, fragilidade e também muito amor! Vi o lado mais frágil das pessoas. Se eu dissesse que metade do programa era passado a conversar, ninguém acreditava”.
Destruir o preconceito
Embora recentemente tenha desistido da prostituição para voltar a estudar, Gabriela continua a servir-se da arte da escrita para afirmar que a culpa não tem lugar na maneira como cada um sente prazer. E já está a trabalhar no seu segundo livro e no guião de adaptação para cinema.
Aliás, foi para denunciar a repressão sexual e a desigualdade de que as mulheres são vítimas que escolheu ingressar no mestrado de Educação Sexual. Na academia vê a hipótese de continuar o longo périplo pela legalização da prostituição e para destruir o preconceito que existe à volta das mulheres que escolhem esta actividade como um caminho para o prazer. Mas não nega que ela seja, ao mesmo tempo, um problema da sociedade. “A prostituição não dá dinheiro fácil, mas sim rápido. Então eu acho que a solução é criar carreiras que valorizem essas mulheres, que tragam melhores salários, condições para elas estudarem, para terem o mesmo nível de igualdade que os homens”. No futuro deseja até dar aulas de escrita criativa a essas mulheres. Apropriando-se do slogan das feministas da ‘marcha das vadias’ do Brasil, Gabriela resume: “Nem santa, nem puta: mulher”.