Os portugueses têm fama e proveito de improvisadores e lamurientos; pela parte que me toca, não contribuo para a aumentar.
Finalmente, na passada terça-feira, o Pavilhão passou para as mãos do Estado. Passou, pelo menos, a ter dono.
Até então pertencia à Parque Expo, empresa que está 'em processo de extinção' há um ror de anos, e cujo accionista maioritário é o próprio Estado.
Em 2011, o Governo tentou vender o Pavilhão por 22 milhões de euros, aos quais teriam de somar-se mais 10 milhões para obras – as casas vazias degradam-se.
Em 2015, acabamos de saber que vale 13 milhões (ou, mais exactamente, 12.985 mil euros), visto que foi entregue ao Estado com esse valor, a abater na dívida da empresa.
Registo que, em quatro anos, o valor do Pavilhão desceu quase para metade. Imagino que o seu futuro será a venda – mas a quem, e para quê?
O ex-libris arquitectónico da Expo 98 tem o nome e a funesta marca do país, desde há séculos consistentemente empenhado em lançar ao mar os seus talentos e premiar a mediocridade.
As vidas de Luís de Camões e do Padre António Vieira dão exemplo dessa consistência, para não irmos mais perto, ao Pessoa que nem um lugarzinho de bibliotecário conseguiu que lhe dessem, quando respirava e incomodava muita gente.
Amamos os poetas mortos e os edifícios arruinados. Em vida, só respeitamos os videirinhos, que vão roendo e subindo, atentos e obrigados, citando mortos e adaptando-lhes o molde ao corpo e ao gosto do tempo. Entre o medo e a inveja faz-se uma existência tranquila.
Que se chame Praça Cerimonial à área coberta pela deslumbrante pala criada por Siza seria irónico se não fosse patético: o que ali se tem vivido, nos longos intervalos entre comícios e galas, é a Cerimónia do Abandono.
Enchemos a boca com a necessidade de estimular o 'turismo cultural' e criamos um museu do vazio. Pelo menos abram-no, para que possamos viver a experiência completa do vácuo.
Peçam a algum dos génios contabilísticos que o país tem em cada esquina que faça as contas aos custos da obra e do seu abandono. Imaginemos que ali existia desde 1998 um museu multimedia – de Língua, de Literatura, de Arquitectura, de Artes Visuais, o que quiserem. Ideias para o Pavilhão nunca faltaram, ou não fôssemos nós um povo criativo.
Na miséria vigente, eu sugeriria que se criasse um protocolo com a Fundação Calouste Gulbenkian e com o Museu da Língua de São Paulo e se fizesse daquele lugar uma montra do acervo de arte moderna e contemporânea da Fundação e das exposições do Museu da Língua.
Mas imaginem que existe ali um museu desde há quase duas décadas – e façam as contas à bilheteira, à loja e aos eventos especiais (só para ficarmos pela eloquência do excell e não entrarmos nos devaneios semiológicos e simbólicos que ofendem o pessoal do rigor e da austeridade).
Talvez essas continhas alcancem o que os meus patrióticos e repetidos brados não têm conseguido: comover quem pode.