Quando o rival ataca. Jesus à imagem de Paulo Sousa e Figo

A saída de Jorge Jesus em direcção ao Sporting veio reacender um assunto que não é muito bem visto pelos adeptos portugueses: a troca entre rivais. Palavras como “traidor” ou “judas” foram as mais utilizadas pelos adeptos do Benfica para classificar Jesus, treinador que se tornou persona non grata no Estádio da Luz. 

Esta não foi a primeira vez que um treinador trocou o Sporting directamente pelo Benfica, mas dessa pouca gente se lembrará. Tudo aconteceu em 1931 quando Arthur John, após ter vencido a Taça de Portugal pela segunda vez consecutiva (ainda se designava Campeonato de Portugal), decidiu trocar as “águias” pelos “leões”. Nenhum dos outros oito técnicos que orientaram os dois rivais de Lisboa – destacando-se Otto Glória, Fernando Santos ou Jesualdo Ferreira – se mudou directamente para o vizinho da Segunda Circular.

Mas nem só de trocas de treinadores se faz a rivalidade entre Benfica e Sporting. Desde a fundação dos dois clubes que vários futebolistas mudaram para o lado do rival. E o Verão quente de 1993 é talvez o momento mais marcante do futebol português, a este nível.

Toda esta história começa um pouco antes do final da temporada 1992/93, que terminou com o FC Porto a conquistar o bicampeonato. Sousa Cintra, na altura presidente do Sporting, tinha anunciado que Paulo Futre estava de volta ao clube que o tinha formado. No entanto, e depois um volte face incrível, o extremo acabaria por assinar pelo Benfica e ajudar a conquistar a Taça de Portugal, numa época em que as dificuldades financeiras do clube tornaram a gestão insustentável.

E foi precisamente essa débil situação financeira que permitiu que meses mais tarde Paulo Sousa e Pacheco deixassem os ‘encarnados’ para assinar pelo Sporting. Os jogadores, então com 23 e 26 anos, respectivamente, alegaram salários em atraso para rescindir o contrato. Os adeptos do clube da Luz não apelidaram-nos de traidores.

A ‘vingança’ de Sousa Cintra pelo ‘roubo’ de Futre poderia ter ido mais longe. O presidente leonino tentou ainda tirar ao Benfica João Vieira Pinto e Rui Costa, os jogadores mais queridos da massa associativa ‘encarnada’. No entanto a operação não foi bem-sucedida. Anos mais tarde, JVP acabaria por assinar pelo Sporting, depois de ter sido dispensado pelo Benfica durante a presidência de Vale e Azevedo.

Como estes, também existem outros casos bem conhecidos, como os de Simão Sabrosa, João Moutinho, Carlos Martins, Jardel, Paulo Bento, entre outros.

Mas o que em Portugal alimenta o ódio entre rivais, em certos países é visto como uma oportunidade de negócio. É certo que o FC Porto e o Sporting já trocaram jogadores por acordo entre as duas partes – como Peixe e Costinha por Bino e Rui Jorge -, mas entre ‘leões’ e ‘águias’ a hipótese nem se coloca. Não é o caso do que acontece em Itália entre AC Milan e Inter de Milão, rivais de ‘sangue’ que partilham o mesmo estádio.

Um dos últimos casos que envolveu estes dois clubes aconteceu em 2012, quando Pazzini ingressou no Milan e Cassano fez o percurso inverso. Em Portugal, seria impossível imaginar, por exemplo, um acordo para Slimani assinar pelo Benfica e Jonas pelo Sporting.

Mas não é só em Itália que este tipo de negociações pacíficas é comum entre emblemas rivais. Em Inglaterra também é uma realidade. O holandês Robin van Persie é um exemplo. Em 2012, o avançado disse que queria deixar o Arsenal e ir à procura de novos desafios, num clube que lhe desse títulos. O Manchester United chegou-se à frente e contratou-o. Resultado: conquistou o título inglês com Van Persie na pele de melhor marcador, com 26 golos.

Claro que Portugal não é caso único, quando se trata de abrir conflitos entre clubes por causa de jogadores desviados. Em Espanha, estas situações funcionaram de forma muito semelhante ou até pior. Depois de trocar o Barcelona pelo Real Madrid, até cabeças de leitão foram arremessadas a Luís Figo na sua primeira aparição em Nou Camp com a camisola dos merengues.