Há 19 mil cães perigosos em Portugal

São já 19.202 os cães de raças potencialmente perigosas registados em Portugal. Segundo dados da Direcção-geral da Alimentação e Veterinária (DGAV), foram registados na base de dados do Sistema de Identificação e Registo de Caninos e Felinos (SICAFE) três mil destes animais, nos últimos três anos.   

Entretanto, sucedem-se as situações de perigo: só nos primeiros três meses deste ano, a GNR registou 22 ataques de cães de raça potencialmente perigosa a pessoas e a outros animais – quase metade do total de ataques que ocorreram no ano passado, em que foram sinalizadas 46 situações.

Além dos casos que não chegam a ser notificados às autoridades, muitos ocorrem em centros urbanos e são reportados à PSP, que não respondeu às questões do SOL. Um das últimas situações aconteceu há cerca de um mês:  uma idosa de 83 anos ficou em estado grave depois de ter sido atacada em Rio de Mouro, Sintra, por quatro Pit Bull que saltaram o muro do seu quintal. A reacção dos vizinhos, que atiraram água sobre os animais, acabou por salvá-la (ver caixa).

A maior parte dos ataques (13)  reportados ao Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, teve como alvo, porém, outros animais – como cães e vacas. 

Mas as agressões a pessoas também são frequentes: ao SEPNA chegaram em três meses nove situações de ataque a pessoas, sobretudo de cães Rottweiler, Doberman, Pit Bull e Pit Bull Terrier. A lista inclui cães de outras raças, considerados perigosos depois de atacarem.

Donos são principais alvos
Os ataques não costumam ser contra estranhos. «Estas agressões», conta o major Ricardo Alves, responsável pelo SEPNA, «são dirigidas, sobretudo, aos próprios donos e a pessoas que os cães conhecem, que frequentam a casa». E são as pernas que mais recebem mordeduras. «Um dos casos que nos chegou foi o de uma senhora de 63 anos que foi atacada nos membros inferiores», acrescenta. Uma das questões por trás destes ataques, salienta o mesmo responsável, é a falta de treino especializado: «É fundamental que os donos treinem estes cães». 

A regulamentação da lei que prevê a certificação dos treinadores de cães perigosos e potencialmente perigosos bem como a formação dos seus detentores continua, porém, na gaveta. «Foram preparadas as propostas de portaria, que estabelecem os requisitos relativos à certificação dos treinadores e à formação dos detentores de cães perigosos e potencialmente perigosos [no âmbito da Lei n46/2013 que aprovou o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos, enquanto animais de companhia], que aguardam aprovação», refere fonte oficial da DGAV.

E apesar de tantos donos escolherem ter cães de raça potencialmente perigosa, os dados do SEPNA apontam para uma ausência de cuidados com os mesmos: em 2015, houve 252 infracções. No ano passado, foram encontradas por esta autoridade 1.230 situações passíveis de contra-ordenação. 

As infracções mais frequentes são, adianta o major Ricardo Alves, «a falta de registo, de licença ou licença caducada; a falta de seguro de responsabilidade civil válido; de esterilização; de vacinação anti-rábica; de chip e de alojamento sem que existam condições de segurança». Além das coimas ou penas aplicadas, e «consoante a gravidade das situações e a culpa do agente, podem ser aplicadas, cumulativamente, outras sanções», explica o mesmo responsável. A perda dos animais a favor do Estado e a proibição de detenção de cães perigosos por um máximo de 10 anos são dois exemplos. 

A maioria das coimas, porém, é arquivada pela DGAV. Segundo fonte oficial do organismo, este ano registam-se 11 processos de contra-ordenação. Em 2014, foram aplicadas 51 multas «por incumprimentos do dever especial de vigilância do detentor de canídeos perigosos e potencialmente perigosos».

O que aconteceu a Zico
Quanto aos animais, podem «ser retirados aos proprietários e entregues a canis municipais para sequestro ou quarentena». Cabe ao veterinário municipal decidir se o animal é recuperável ou deve ser abatido. Mas, sublinha ainda o responsável do SEPNA, «é raro o veterinário decidir-se pelo abate». No caso de Zico – o Pit Bull que há dois anos mordeu um bebé de 18 meses, em Beja, que acabou por morrer – a veterinária determinou o abate. Mas depois de uma petição e de uma providência cautelar, Zico acabou por ser entregue pelo tribunal à associação Animal, que se dedicou a recuperá-lo. Teve treino positivo especializado pela All About Dogs e passou a chamar-se Mandela.

sonia.balasteiro@sol.pt