Frente e Verso

Já não saio para as marchas. Deixei de o fazer, deixou de ser necessário. Lisboa em mim passou a ser mais um lugar interior (que vivo e imagino) do que um estado de espírito. Talvez por isso sempre que ligo a televisão e Alfama desce a Avenida (com gatos na cabeça ou sem eles) torno…

E penso. 

Quem me abriria a porta da casa onde cresci sem agora tocasse à campainha? Se saísse do lugar onde estou, pedisse um táxi para a Correia Teles, parasse na esquina da Sampaio Bruno, descesse 10 metros na mesma rua onde joguei, corri, fiz recados, chorei, prometi, beijei, troquei cromos, fugi; se finalmente o meu dedo carregasse no primeiro direito e o meu ouvido se colasse ao intercomunicador, quem me responderia? Seria possível que ouvisse a voz da minha mãe, da minha avó, de mim próprio? Porque não o tento se coloco a hipótese? Porque não saio de casa onde estou e me entrego à noite e volto à rua que faz esquina com o que fui?

Quem nos abriria a porta da infância se ousássemos tocar à campainha numa noite de marchas? Porque não o tentamos num próximo Junho? 

luis.osorio@sol.pt