«Vivemos num mundo em que recebemos informação de todos os lados e em que as coisas mais importantes são tratadas da mesma forma que coisas que deviam ser só notas de rodapé. Perdemos a noção da importância. O conto é um mundo estruturado e onde às vezes sinto necessidade de voltar», explica Natália Luíza, encenadora e responsável pela adaptação a par com o escritor.
Ao texto original acrescentam-se outras palavras de Mia Couto noutros livros e, sobretudo, uma personagem que apenas era citada e aqui ganha corpo: o Avô Celestino. «É ele que caminha entre os mortos e os vivos». E em relação à encenação de há 14 anos, embora se mantenham todas as pessoas, muda a abordagem. «A outra versão era mais poética mas esta é sensorialmente mais africana. Está mais próxima do universo fantástico do conto».
O tema fundamental continua a ser o mesmo – a morte. «Nós, ocidentais, temos uma relação terrível com a finitude apesar de a natureza, com os dias que acabam e as noites que começam, nos estar sempre a lembrar disso. Esta peça é mais uma em que trabalho uma visão da morte, como fiz em Pedro Páramo ou em As Centenárias». Isto apesar de algumas pessoas confundirem o livro de Mia Couto, feito com ilustrações, com uma história apenas infantil.
«Os grandes textos e os grandes espectáculos são aqueles em que cada um, independentemente da idade, encontra as suas âncoras em espelho. É matéria onde nos podemos ver, sentir, reflectir, recentrar». Um texto universal, como Natália Luíza acredita que Mar Me Quer é, e que por isso não precisa de uma altura especial para voltar a estar em palco: «É sobre nós, é capaz de unir e de nos acordar a sensibilidade. Isso é essencial numa altura em que há tanta incapacidade de reagir e de nos juntarmos».