A tradição da Broa de Avintes faz-se desde há muito e a sua história remonta a uma decisão de D. Dinis que, preocupado com o crescente número de incêndios que grassavam na cidade de Porto, decidiu que as padarias deveriam ser afastadas da cidade. Assim, no decorrer desta decisão, para Valongo foram os padeiros que utilizavam a farinha de trigo como ingrediente na feitura do pão (moletes e regueifas). Para Avintes foram deslocados os padeiros que utilizavam a farinha de milho até pela proximidade do afluente do Rio Douro, o Rio Febros, onde se situavam muitos moinhos adequados à moagem do milho. Por este decreto que visava, sobretudo, evitar a propagação fácil e em escala do fogo no interior da cidade, D. Dinis dividiu a feitura do pão entre as "Terras Quentes" e as "Terras Frias". Desde esse tempo, até à actualidade, criou-se uma excelente reputação que faz desta broa alimento apetecido por todos, não só pelos que acarinham a sua história, mas por qualquer português.
Ao longo dos séculos, as padeiras de Avintes criaram fama, não só pela broa densa, pesada e ligeiramente húmida que sempre saiu das suas mãos, mas também pelo modo como a distribuíam. Muitas vezes, eram elas mesmo que faziam de barqueiros nos barcos "valboeiros" e a levavam até ao Porto apregoando-a depois pelas ruas da cidade. Femininas, não deixavam de ser robustas quiçá pelo esforço de amassar a broa. Talvez, fosse essa robustez adquirida nas muitas voltas que davam à massa da broa que as levava a ter destreza para depois conduzir os "Valboeiros" até ao cais conhecido como das Padeiras de Avintes. Valentes, estas padeiras eram olhadas com distinção sendo a sua fama grande. Não só a broa era mimada, como as padeiras, pois dizem que eram muito bonitas.
Tão bela história e tanta fama são hoje contadas com orgulho e fervor pela Confraria da Broa de Avintes, uma das mais antigas do país e cuja acção se faz sentir no movimento das confrarias. Herdeiros de uma forte cultura ligada aos moinhos de milho do Rio Febros, às lindas padeiras e também barqueiras, e a uma broa de sabor inconfundível, os confrades da Broa de Avintes sabem a responsabilidade que têm. Por isso, a broa é companhia fiel em todas as suas deslocações dentro de Portugal ou para o exterior onde a dão a conhecer a confrades de outras confrarias e ao público. Desde 1997 que esta confraria leva mais longe o bom nome e a grande fama desta broa escura e de sabor intenso.
Com a participação desta Confraria, os encontros denominados "Fórum" têm vindo a criar acervo de informação acerca de Avintes, não só da sua broa famosa, como também de outros elementos culturais, económicos e sociais deste concelho. Tal demonstra que uma confraria releva, não só o património gastronómico, mas igualmente, promove a associação entre este e o restante património material e imaterial que caracteriza um povo. À volta da broa, descobre-se o que distingue Avintes, o que faz a sua história e quais os símbolos culturais que a atravessam.
Com a sua primeira edição em 1997, o Concurso de Quadras à Broa de Avintes, iniciativa da Associação Recreativa Avintense, tem dado grande impulso à notoriedade desta broa pelo mundo português. Para além da participação de alguns poetas nacionais, também os portugueses espalhados pelo mundo dão a sua contribuição para a divulgação desta broa. Verdade também, é a referência desta obra em alguns dos clássicos da literatura portuguesa tal é a sua importância na alimentação nortenha.
O momento maior da celebração deste elemento central da alimentação local acontece na Festa da Broa que acontece desde 1989 pela iniciativa da Junta de Freguesia. Esta encontra na Confraria da Broa de Avintes um parceiro irrepreensível que muito ajuda ao sucesso da iniciativa. Mobilizados os confrades, a festa decorre em prol da broa e de toda a cultura local num momento de partilha onde a rainha é de Avintes. É a broa.
Trajados de castanho, entre o escuro debruado pelo claro, a lembrar a cor da broa, os Confrades da Broa de Avintes não esquecem a rica história que têm a obrigação de contar. A história da Broa de Avintes encontra-se com a história do Porto, e com a história nacional. A Broa de Avintes encontra-se com os outros pelo seu sabor, pela sua história, pela mestria das mãos de onde nasce. Os confrades não esquecem o seu dever de acordar o futuro de Avintes pela história que se fez ao longo de séculos. Reconhecida como Produto Tradicional Português, em 2001, a Broa de Avintes continua a ser o mote da Confraria. Aliás, é de notar que no simbolismo da broa enquanto alimento de todos e para todos, esta Confraria mantém em cada cerimónia capitular o dever de alimentação ser de e para todos. Cada encontro nos capítulos é sempre uma partilha do alimento que a terra deu e que Deus abençoou e continua a abençoar sempre que cada padeira amassa a mistura de farinhas de milho branco e de centeio e a deixa levedar tapada por uma manta. Coze no forno e deixa-se comer sempre mais e mais, sempre à espera de mais. A reciprocidade do alimento faz-se notar nesta broa e na Confraria que a representa, sem dúvida.
*Presidente das confrarias gastronómicas portuguesas