“Há uma forte ligação e cumplicidade do público com o festival”, comenta o programador – e a alma – do Festival Músicas do Mundo (FMM), Carlos Seixas. Desde 2008 que o evento conta com mais de 80 mil espectadores em cada ano.
Ponto prévio: o que são hoje as músicas do mundo? “Neste momento não faz sentido o conceito pequenino de world music em relação às outras músicas, é redutor. Vivemos um momento de grande criatividade, de mistura, contaminação, migração, o mundo de hoje é de interculturalidade total, em que a música não se divide em prateleiras. Não estamos à procura do esquisito, do étnico, do folclórico, mas da palpitação da música global”.
À 17.ª edição, o FMM apresenta-se como uma marca estabelecida internacionalmente (a revista inglesa Songlines, por exemplo, inclui-o nos 25 melhores do mundo), mas “porque a crise chega a todos e há necessidade de conter despesas”, o cartaz é menos exuberante do que em edições anteriores. Seixas recorda que o festival, o “maior evento da cidade e da região, é um serviço público” organizado pela Câmara Municipal e, como tal, sujeito a restrições orçamentais. “Há um regresso às origens, há menos grandes estrelas e mais descoberta”. Com uma garantia: “Não se corta na qualidade”.
O FMM arranca hoje (e prossegue até domingo) em Porto Covo com a actuação de Janita Salomé e termina nas primeiras horas de dia 26, quase 50 actuações depois, com uma sessão de DJ muito especial.
Pelo meio, uma forte embaixada africana encabeçada por Salif Keita, e que inclui Toumani Diabaté (já uma visita regular ao nosso país) e o filho Sidiki, Orlando Julius, Ibibio Sound Machine ou Songhoy Blues.”Desde sempre se entendeu que África é central, tem de se representar dignamente. Este é o festival em que a música africana é tratada com o estatuto que merece”, comenta Carlos Seixas.
A outra tendência desta edição é a forte presença de artistas europeus, da Lisboa do fadista Ricardo Ribeiro à São Petersburgo da banda rock feminina Iva Nova. “Este ano calhou, se calhar a parte europeia estava um pouco esquecida, e num momento tão grave como o que estamos a viver na Europa é interessante que haja uma presença mais expressiva no festival”.
Seguem-se, por local de actuação, algumas propostas menos óbvias de Carlos Seixas.
Porto Covo
Forabandit (Hoje, 21h45)
Soema Montenegro (Domingo, 20h)
“Dois projectos interessantes, um do Mediterrâneo, outro da Argentina, ligados à tradição e à cultura, de uma criatividade enorme”. Os Forabandit são a junção dos sons das regiões da francesa Occitânia (Sam Karpienia) e da turca Anatólia (Ulas Özdemir), com as percussões do libanês Wassim Hallal. Soema Montenegro, cantautora da província de Buenos Aires, canta e toca guitarra e faz-se acompanhar pelo trio El Conjuro.
Centro de Artes
Paolo Angeli (Terça, 21h45)
“Este ilhéu da Sardenha é extraordinário”. Munido de um instrumento invulgar, uma guitarra preparada com 18 cordas, o compositor e instrumentista Paolo Angeli extrai uma paleta de sons que faz dele um one man show algures entre a música tradicional sarda e as vanguardas contemporâneas.
Castelo de Sines
Guillaume Perret & The Electric Epic (Quarta, 23h15)
Moriarty (Sábado, 25, 21h45)
“Duas propostas de certa forma opostas, o jazz hard de Guillaume Perret e uma ligação à tradição norte-americana a partir de uma visão europeia, os Moriarty”. A origem geográfica é comum – Paris -, mas o que o saxofonista Guillaume Perret e o seu grupo constituído por guitarra (Nenad Gajin), baixo (Laurent David) e bateria (Yoann Serra) trilham é território muito diverso dos Moriarty, sexteto encabeçado pela cantora Rosemary Standley, e que já se tinha dado a conhecer aos sineenses em 2008.
Avenida da Praia
Alif (Quinta, 20h15)
Awesome Tapes from Africa (Domingo, 26, 6h)
“Alif é o grupo que representa o mundo árabe de forma mais engajada; Awesome Tapes from Africa é um DJ set do homem que tem um blogue fantástico e com quem tenho conhecido alguma da melhor música de África”. Alif é a primeira letra do alfabeto árabe e resume o espírito deste quinteto formado em 2012 por um palestiniano, dois libaneses, um egípcio e um londrino nascido na Síria filho de pais iraquianos. No disco de estreia, Aynama-Rtama, gravado entre Beirute e o Cairo e misturado na capital inglesa, o resultado está à vista Juntam os instrumentos típicos árabes como o oud e o buzuq à electrónica e a textos de poetas árabes.
Para fim de festa, já com o Sol a fazer companhia aos resistentes (ou aos madrugadores), o etnomusicólogo norte-americano Brian Shimkovitz abre a mala e dá a conhecer alguns dos sons mais genuínos e desconhecidos de África, através da sua colecção de cassetes, fruto de recolhas do próprio em viagens por aquele continente.