Com o apoio do Livre às costas e o silêncio oficial do PS, o ex-reitor tem contado, de vez em quando, a seu lado, com a cumplicidade austera de Eanes, enquanto os dois outros ex-Presidentes – que lhe deram a mão – se evaporaram.
Pior: ao que tudo indica, não são apenas rumores a disponibilidade de Maria de Belém para se candidatar, incentivada ainda por sondagens favoráveis e pelas petições de ‘notáveis’ – entre os quais reitores que não se revêem em Nóvoa – que a desejam ver na corrida.
A formalização da candidatura ‘independente’ de Nóvoa, encenada no Teatro da Trindade, arrisca-se a não ter passado de uma récita amadora própria de Queima das Fitas, o que, a confirmar-se, o deixa em muitos maus lençóis, sem margem de recuo e sem máquina que o promova… e pague a despesa.
A paragem forçada em Agosto, com os portugueses a banhos, retira-lhe palco. Depois, a prioridade no calendário partidário vai para os comícios habituais da rentrée, aditivados pela proximidade das legislativas.
Neste contexto, até Outubro, sobejará pouco espaço para Nóvoa encontrar o seu, no meio da agitação dos estados-maiores, que nem querem ouvir falar de presidenciais antes de saberem quem vai governar.
Em tempo, vão surgindo alguns sensatos ‘avisos à navegação’.
Por exemplo, o de Guilherme d’Oliveira Martins, para quem “a experiência política é fundamental” num candidato a Belém. Tudo o que falta a Nóvoa e sobra ao presidente do Tribunal de Contas.
Diga-se de passagem que Guilherme d’Oliveira Martins poderia protagonizar – como já se escreveu há meses neste espaço – uma estimulante candidatura.
Se o fizesse, tendo Marcelo Rebelo de Sousa como adversário à direita, haveria duas propostas com currículo de peso, assegurando um confronto com elevação e civilidade.
Por diferentes caminhos, ambos já viveram governos por dentro, têm carreiras próprias, são cultos e conhecidos do eleitorado (sem precisarem de outdoors), têm experiência internacional, serviram o Estado sem nunca se servirem dele. Não é pouco.
Um óbice, porém: estão fora da lógica aparelhística do PS e do PSD, embora tenham estatura política bastante para, querendo, desencadearem uma candidatura sem negociarem o ámen prévio das estruturas partidárias.
Com a família socialista desavinda, falhadas as hipóteses de António Guterres e de Jaime Gama – para além do ‘eterno’ António Vitorino -, e estando Durão Barroso fora da corrida, os nomes de Guilherme d’Oliveira Martins e de Marcelo Rebelo de Sousa garantiriam uma disputa presidencial longe de chicanas pessoais e de politiquices de mercearia.
Se ambos aceitam ou não reconhecer-se nesse desafio, é outra questão. E, até hoje, os sinais são escassos do lado de Guilherme d`Oliveira Martins, e contraditórios em Marcelo.
Enquanto pondera, Marcelo terá de resistir ao ‘cerco’ da TVI na tentativa de instrumentalizar a sua popularidade, quer ao interromper com publicidade o seu espaço de comentário, quer ao envolvê-lo na promoção de iniciativas da casa.
À parte estes sinais, vai longa a lista de putativos candidatos a Belém, desde o voluntarismo de Henrique Neto a Santana Lopes, a Rui Rio e a Alberto João Jardim, a par de mais alguns que andam por aí, afadigados, a recolher assinaturas de incautos.
De todos, Nóvoa é o único com ambições assumidas, no meio de um discurso esquerdista, bordado de lugares comuns, próximo do movimento radical de Rui Tavares – que o incensa, isolado -, e dos revolucionários nostálgicos do 25 de Abril, ancorados na sua Associação.
António Costa não se descose, inquieto com as sondagens e com tudo a correr-lhe mal, desde Sócrates e Vara presos – carregando suspeitas de monta -, até aos outdoors que têm sido o gozo das redes sociais, e que já fizeram uma vítima com a demissão do director de campanha.
E se estas desgraças não fossem suficientes, os indicadores do desemprego em queda e o comportamento positivo das exportações (apesar de Angola) contrariam as previsões sombrias da oposição.
O trabalho de formiga de Passos Coelho e de Maria Luís – e o mealheiro que juntaram para as contingências – serão argumentos preciosos em campanha para influenciar os indecisos, mais propensos à segurança do que em arriscar na incerteza.
Por aqui se percebe que a vida não está fácil para António Costa, nem para Nóvoa, que contava com ele.
Ao ungir-se, há meses, como profeta de um destino glorioso, Costa tem vindo a revelar-se um baralho sem trunfos. E Nóvoa, que cedo foi a jogo, nem se apercebeu do bluff…
Crónica originalmente publicada na edição em papel do SOL de 14/08/2015