Vai um café?

“Veja se pode estar amanhã na ‘Brasileira’ do Chiado ao meio-dia em ponto”. O encontro foi marcado por carta há mais de cem anos por Fernando Pessoa, que solicitava a presença do amigo Armando Côrtes-Rodrigues num dos seus espaços de eleição.

As tertúlias, clubes e cafés foram (e ainda são) focos da vida comunitária, locais privilegiados para o debate e, por consequência, verdadeiras estufas de criação artística e intelectual. A historiografia é consensual em indicar Inglaterra como o berço dos primeiros clubes e cafés (pubs, diminutivo de public spaces) e a Itália como o território onde as tertúlias nasceram, a partir do Renascimento. Os costumes foram rapidamente adoptados por uma Europa sedenta de conhecimento. Pintura, política, filosofIa e literatura eram os temas dissecados.

Em Portugal, os intelectuais daquela que ficou conhecida como geração de 70 (ou queirosiana) ficaram indelevelmente ligados a locais como o Café Martinho.

Antes deles, Bocage já frequentara o Nicola e as elites políticas do século XIX repartiam-se pelo Botequim das Parras e o Marrare, onde nasceu o famoso bife. O grupo do Leão adoptou o Chave d’Ouro. Os primeiros 30 anos do século XX terão sido, porventura, os mais interessantes para passear no eixo Baixa-Chiado – os Martinhos (do Rossio e da Arcada), a já mencionada Brasileira, o café Montanha…), foram os palcos onde se desenrolaram as mais importantes cenas da vida cultural e política do país.

Veva de Lima recebia, no início do mesmo século, no Palácio Ulrich, naquele que é considerado “o último salão lisboeta, na tradição romântica de centros de reunião de figuras relevantes dos meios literários artísticos e políticos”. Vários modernistas morrem precocemente (Pessoa, Santa-Rita, Amadeo). Chega o Estado Novo. No Norte, o Diana Bar torna-se o poiso de José Régio. Agustina Bessa-Luís e Sophia de Mello Breyner também por lá passam. As tertúlias, como tudo no país, retiram-se para a esfera do espaço privado.