Europa sublinha o ‘aval à austeridade’ mas teme instabilidade

Na imprensa europeia, a leitura é quase unânime: a vitória da coligação Portugal à Frente representa o aval do eleitorado português às políticas de austeridade dos últimos anos, mas o facto de os dois partidos do Governo terem perdido a maioria absoluta que detinham pode trazer uma instabilidade política que poderá pôr em causa a recuperação…

A vitória da coligação de centro-direita representa “a primeira reeleição entre os líderes europeus que impuseram cortes aos eleitores sob os programas de assistência internacional que se seguiram à crise da dívida de 2009”, sublinha a Reuters nos primeiros parágrafos do texto que deu eco aos primeiros resultados da noite. Leitura igual fez o espanhol El Mundo, que chamou esse feito do primeiro-ministro português para a abertura da sua notícia, que no título falava de um “aval à austeridade de Passos Coelho”. No Reino Unido, a BBC relatava os resultados de “uma votação encarada como um referendo a quatro anos de cortes na despesa”.  

Num momento em que recordava a possibilidade da coligação chegar ainda aos 116 deputados, e com isso à maioria absoluta, o El Mundo recordava que “tudo isto depois de Passos Coelho ter sido um bom aluno da troika, aplicando as suas receitas com uma dureza que se refletiu nos cidadãos”. Já o seu concorrente El País, que dá destaque ao assunto na primeira página da edição de segunda-feira, escreve que Passos “deve ser convidado a formar Governo” apesar da “maioria heterogénea de esquerdas que poderá conduzir o país a um período de instabilidade política”.

 

 

Uma ideia também veiculada pela Reuters, onde se avisa que “um Governo minoritário pode alarmar os investidores”, pois recorda-se que “nenhuma administração minoritária sobreviveu um mandato inteiro desde a revolução de 1974 que derrubou o regime fascista de António Salazar”. Lembrando esse mesmo feito, o britânico Guardian defende que “um Governo minoritário será um grande desafio para Portugal”.

Em França, o Le Monde noticia que “a coligação de Direita derrotou amplamente a oposição socialista” liderada por António Costa. O diário lembra que PSD e CDS “inverteram a tendência das sondagens nas últimas semanas de campanha” mas ainda assim vai “ficar longe da pontuação alcançada há quatro anos (50,4%)”. O Le Monde acompanhou o texto com os ‘tweets’ do seu correspondente Jean-Baptiste Chastand, tendo este destacado durante a noite “a ambiguidade do líder socialista, que não exclui nem deixar a direita governar nem negociar com a extrema-esquerda”.

Voltando a Espanha, onde a noite eleitoral teve um acompanhamento mais profundo nos principais jornais, o El Mundo recordou que “o principal discurso da coligação” centrou-se na ideia de “pedir aos portugueses que não deitassem fora todos os sacrifícios feitos ao longo dos últimos quatro anos” enquanto o “ex-autarca de Lisboa “pediu insistentemente aos portugueses para confiarem na alternativa socialista”. A jornalista Virginia López conclui que “os resultados demonstram que Costa não conseguiu convencer o eleitorado”.

Não muito distante da leitura do El País, que escreve que o “duo Passos Coelho-Portas não sustentou a vitória em promessas nem reduções de impostos mas antes na ideia de que o pior já passou e que era melhor não mudar” – “nunca falaram no fim dos cortes, só do seu relaxamento”. Mais próximo da Esquerda, o El País lembra que “outra opção para formação de Governo é uma coligação que some os deputados socialistas, mais os comunistas e Bloco de Esquerda, que foi a grande surpresa da campanha eleitoral”.

nuno.e.lima@sol.pt