É obra que assim aconteça, em especial após os anos de protetorado ao qual fomos sujeitos e em que o XIX Governo Constitucional protagonizou o essencial das medidas odiosas necessárias para podermos sair do maior aperto financeiro e, principalmente, político, da democracia portuguesa.
O lastro dos custos económicos, sociais e políticos destes anos, assim como a identificação das causas das medidas adotadas, acompanhados do realismo, da transparência e da inteligência com que foi abordada a situação, terão permitido que a consciência cívica e política firmasse com clareza uma vontade eleitoral agora expressa.
Essa mesma consciência penalizará fortemente aqueles agentes políticos que verbalizem narrativas de apropriação na secretaria de escolhas eleitorais que sobre eles não recaíram. E o PS percebe-o de tal forma que no próprio discurso da noite eleitoral foi capaz de traduzir com grande fidelidade a expressão “uma no cravo, outra na ferradura”, posição que nesta altura ainda aparenta perfilhar.
Daí também que esteja certo de que as conversações que agora se iniciam tendo em vista a formação de um quadro governativo estável permitirão que os partidos que o devem sustentar se entendam sobre aspetos essenciais de políticas públicas a prosseguir.
Diria que as conversações devem encetar-se pela procura das soluções para as políticas públicas em que possa assentar um quadro de apoio parlamentar, eventualmente com projeção governamental, que agregue os mandatos suficientes no Parlamento para que se consiga assegurar a desejada estabilidade governativa. Sim, porque a normalidade é necessária, não só para os “mercados”, mas para todos os cidadãos, famílias, investidores e empresas, que procuram estabilidade e horizontes de confiança e previsibilidade.
Talvez esta seja a grande oportunidade de o PS se poder voltar a erguer como um interlocutor de maior relevo aos olhos dos Portugueses, pelo que estou certo de que também por isso será possível vir a traçar rotas comuns em diferentes setores – como serão os casos da segurança, da justiça, da fiscalidade ou do ambiente –, assim como as linhas que não deverão ser ultrapassadas.
Esta é mesmo uma enorme oportunidade para que se venham a trilhar soluções reformistas impactantes e de maior perenidade, como poderá ser o caso da reforma do Estado.
Uma solução agregadora como a que se exige permitirá que os protagonistas deste tempo político sejam aqueles que promoveram em Portugal a construção de uma democracia de tipo ocidental, a promoção do espaço lusófono e a integração europeia e atlântica, continuando a evitar também tentações populistas com elevado potencial destrutivo. Estes protagonistas têm agora na mão a oportunidade de continuar a sê-lo nos anos vindouros, em Portugal e na Europa, a benefício do maior interesse nacional. Assim saibam todos agarrar a oportunidade.
* jurista