Anfitriões improváveis

Paróquias, centros sociais e institutos religiosos. A maioria das organizações da sociedade civil que vão receber refugiados têm experiência na área social. Mas entre as 80 instituições que já estão a postos para alojar 420 pessoas há também sociedades de advogados (como a Campos Ferreira, Sá Carneiro & Associados) psicólogos (empresa Despertar), colégios, uma agência…

Inácio Roseira e os colegas que trabalham na Nomat, uma agência de viagens de aventura, conhecem bem alguns países de onde têm fugido milhares de refugiados. A “sensibilidade cultural, religiosa e tolerância” que dizem ter adquirido nestas viagens terá sido determinante para serem aceites como instituição anfitriã pela Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), organização que está a coordenar os esforços da sociedade civil.

O grupo informal de 20 trabalhadores vai assumir os encargos do alojamento e a integração de cinco pessoas no Porto. “Vamos alugar um apartamento e assegurar alimentação, roupa, etc. Acreditamos que seremos capazes de integrar esta família na cultura portuguesa”, disse ao SOL Inácio Roseira, acrescentando que o grupo de amigos está também preparado para orientar os refugiados na procura de trabalho, serviços de saúde e educação. Para já, vão receber a formação disponibilizada pela PAR e aguardar, expectantes, o contacto das autoridades. A missão é desafiante, reconhece Inácio Roseira, mas a motivação é grande: “Será uma forma de retribuirmos o que estes países nos têm dado”.

Foi a mesma vontade de ajudar que levou a Cáritas da Sertã a coordenar esforços locais para acolher durante dois anos três famílias de refugiados. Uma ficará numa casa da família do padre, outra numa habitação desocupada de uma família da paróquia e a terceira numa antiga escola primária que está a ser reabilitada pela autarquia para acolher pessoas em situações de emergência.

“Vamos assumir os encargos em conjunto com outras organizações”, explica ao SOL o padre Lúcio Nunes, da Cáritas da Sertã. A alimentação será assumida pela misericórdia, a assistente social pela Cáritas, as despesas da luz pelos proprietários. O sacerdote reconhece dificuldades laborais no meio rural, e até alguma “desconfiança e receio já manifestada pela população”, mas acredita que tudo será feito para apoiar estas famílias.

No Montijo, as 18 pessoas que a Fundação COI acolherá ficarão alojadas no mesmo bairro, perto da escola primária e das unidades de saúde. “São uns apartamentos equipados que serviam outra resposta social e que agora estão desocupados”, explicou ao SOL, Carlos Taleço, presidente do da fundação. O facto de esta ter uma vasta obra social, e parcerias com as entidades de emprego e formação profissional, também será uma mais valia para estas famílias, acredita este responsável.

SEF diz que atraso é dos centros de triagem na Europa

A maioria das instituições já inscritas na PAR Famílias são institutos religiosos (26%), fundações e associações (25%) e instituições de solidariedade social (19%). Mas também há juntas de freguesia, lares e colégios, como os Maristas de Carcavelos. Há um grande peso de organizações católicas – como os Salesianos que receberão uma família num apartamento na Amadora – mas a instituição que mais pessoas está disponível para acolher no imediato é a Fundação Islâmica de Palmela, que tem casa para 56 pessoas.

Os recursos para apoiar os 4.500 refugiados da Síria, Eritreia e Iraque estão a ser constantemente atualizados pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – coordenador da equipa interministerial – e incluem entidades públicas, privadas e do setor solidário. A PAR está a gerir os recursos da sociedade civil. Feito o levantamento das instituições anfitriãs, estas começarão agora a ser validadas por grupos locais, explica ao SOL o SEF. E a receber formação em ética do acolhimento e trauma.

A principal dúvida prende-se com a data de chegada dos primeiros refugiados, prevista para o início de outubro e constantemente adiada. O presidente da PAR, Rui Marques, criticou há dias a “lentidão e paralisia das instâncias europeias”. Fonte oficial da Comissão Europeia garante ao SOL que todos os passos para a recolocação de refugiados são coordenados entre os países onde estes estão (Itália e Grécia) e os que os vão acolher. “É um processo de coordenação bilateral que é demorado e o qual a Comissão Europeia se limita a acompanhar”.

O SEF diz que é o moroso processo de identificação das pessoas que está a atrasar o processo. Mas sublinha que “nos centros de triagem apenas estão as autoridades de Itália e da Grécia e as agências europeias (EASO e FRONTEX), pelo que os Estados-membros não têm acesso ao que se está a passar no terreno”. Os dois oficiais de ligação portugueses destacados para o processo nem sequer estarão no local, mas em Atenas e em Roma.

rita.carvalho@sol.pt