Esta iniciativa, que Paris realiza desde 2002, ultrapassou fronteiras e acontece hoje em diversas cidades europeias – Braga tem a sua desde há 5 anos.
A Noite Branca de Paris contou com mais de 130 projetos de artistas plásticos, além de espectáculos de música um pouco por toda a parte, na rua ou em monumentos nessa noite abertos ao público.
Na Catedral de Notre-Dame, houve um concerto de órgão.
Em frente ao Hotel de Ville, uma instalação do artista chinês Zhenchen Liu, 270 blocos de gelo colorido simbolizando o mundo, que deveriam derreter lentamente ao longo da noite e formar uma pintura conjunta. De facto, como a noite se mostrou inesperadamente primaveril, alguns blocos derreteram tão depressa que a praça mais parecia um lago – mas a animação continuou até ao fim da madrugada, com inúmeros carrinhos de kaftas ou cachorros quentes ao redor da obra e os cafés e esplanadas da zona abertos e cheios de clientela.
No centro de Lisboa, assim que se inauguram meia dúzia de hostels e os charters de turistas se intensificam ligeiramente, desata tudo a bradar contra a «invasão»: protestam os moradores, pela falta de sossego, protestam hoteleiros, sucedem-se as reportagens sobre as consequências assustadoras do amor dos visitantes e a sobrelotação da capital.
Sei por experiência própria que é difícil convencer muitos cafés e restaurantes lisboetas a alargarem o horário por uma noite, para um evento de rua especial – ou até, simplesmente, a aproveitarem um espaço extra e gratuito de esplanada que lhes permita duplicar a clientela: «É muito trabalho, não vale a pena».
Paris regurgita de turistas – e está sempre a inventar motivos para os atrair ainda mais.
Em Lisboa não é fácil almoçar às três da tarde nem jantar às dez da noite – «a cozinha já fechou, minha senhora». Os esforços para comover o chefe ou afagar-lhe o ego – «dê lá um jeitinho, gabámos tanto a excelência do vosso bacalhau e estes nossos amigos voltam amanhã para o país deles» – são, em geral, vãos. Ora adeus: se queriam bacalhau, viessem mais cedo; nem um pastelinho para recordação.
Em Paris, difícil é escapar aos apelos dos garçons especializados em marketing: «Falam português? Vêm de Portugal? Ah, Porto, Penafiel, Vila do Conde, tanto que gostei de andar por lá» – e o argelino não descansa enquanto não nos enfiar no seu restaurante, perseguindo-nos com ofertas de vinho e entradas.
Paris é também a cidade das livrarias – várias delas abertas até às onze da noite. Das duas existentes ao lado dos famosos cafés existencialistas de Saint-Germain-des-Prés, uma – La Une – fechou.
Mas continua a haver muitas, e sobretudo com vastidão de oferta: para um português, é estranho ver mesas e mesas cobertas de livros de filosofia, poesia, literatura, com capas sóbrias e apetecíveis, em vez de metros e metros de capas douradas ou embrulhadas em sacos de tule cor-de-rosa.
Volta-se de Paris com a sensação de que, ao contrário do que se ouve em Portugal de minuto a minuto, há mundos alternativos. E cheios de possibilidades.