As vítimas portuguesas do Estado Islâmico

Entre as vítimas do terrorismo do Estado Islâmico, contam-se três portugueses. Dois perderam a vida nos atentados de Paris de sexta-feira passada, enquanto a outra morte ocorreu a 26 de junho deste ano, no ataque a um hotel na Tunísia.

Maria da Glória Moreira

Maria da Glória Moreira tinha viajado sozinha para a localidade de Port-el-Kantaoiu, na província de Sousse, na Tunísia. Passava férias no Imperial Marhaba, um hotel da cadeia RIU. A antiga professora de piano de Vila Nova de Gaia tinha 76 anos. Escolhera a Tunísia por estar familiarizada com o local e se sentir segura naquela unidade hoteleira, que já conhecia de década e meia de férias ali passadas na companhia do marido. Era a primeira vez que Maria da Glória retomava o hábito de passar férias em Sousse desde a morte do marido, há dois anos.

À SIC, o seu genro disse que a família estava feliz por Maria da Glória ter tomado a decisão de retomar os velhos hábitos, deixados de lado desde a viuvez. “A família estava toda muito contente, era sinal de que ela estava a reviver”. E falam sobre a personalidade de Glorinha, assim chamada no seio familiar. "Era extremamente criativa, uma pessoa culta, com um sentido estético da vida muito importante, de um bom gosto muito grande”, lembrou ao DN Maria do Céu, irmã mais nova de Glória. A primeira vítima portuguesa do autoproclamado Estado Islâmico tinha uma educação esmerada que se plasmava num forte sentido de liberdade.

O atentado de Sousse provocou 38 mortos. A maior parte das vítimas mortais era de origem britânica, mas também foram mortos belgas e alemães.O atirador – que entrou na praia escondendo a arma dentro de um guarda-sol – foi abatido pelas forças de segurança. Seifeddine Rezgui Yacoubi era estudante, tinha 23 anos e disparou durante 25 minutos. 

 

Précilia Correia

O jornal francês Libération, escreve que Précilia gostava de fotografia, snowboard e cozinha. Na sua página no Facebook – era notório que gostava de Portugal – a sua imagem de capa era a fotografia de uma praia da zona de Setúbal. Este gosto é corroborado ao DN por Anabela Carpinteiro, uma amiga próxima da vítima. "Em 2012 [a Précilia] tirou uma licença sem vencimento de nove meses para ver se conseguia arranjar emprego cá [em Portugal], para poder viver aqui, sonho que tinha há muito tempo”.

Tinha 35 anos, era filha de pai português e mãe francesa e tinha dupla nacionalidade. O pai é zona de Sarilhos Grandes, no concelho do Montijo, local a que Précilia voltava recorrentemente. Trabalhava na empresa FNAC e foi descrita pelos seus colegas como uma pessoa marcante e preocupada: “Tocou todos os que trabalharam com ela”.

Sexta-feira passada, assistia ao concerto dos Eagles of Death Metal na sala de espectáculos Bataclan na companhia do namorado, Manu Perez. Nem Précilia nem Manu saíram do concerto com vida.

 

Manuel Colaço Dias

O taxista de 63 anos vivia e trabalhava em Reims, a 100 km de Paris. Natural da aldeia de Corte Pinto, perto de Mértola, tinha emigrado há 45 anos para França. O jornal O Lidador, de Mértola, recorda que era casado com Elia Dias e tinha dois filhos que moram em Portugal. A semana passada, também a sua mulher se encontrava no país de férias, tendo o marido ficado em Paris.

Na sexta-feira, Manuel – que era motorista – tinha deixado três adeptos junto ao Stade de France. Foi a única vítima dos três bombistas suicidas que se fizeram explodir nas imediações do estádio.

Visitava constantemente a aldeia do Rosário em Almodôvar, de onde a mulher era natural. Sportinguista ferrenho, foi homenageado no Twitter pelo clube.

Os seus colegas, citados pela France 3, recordaram um homem trabalhador e simples. "Já não há muitos como ele" disse o seu patrão, da Regnault Autocars. 


 

Além de terem sido assassinados pela mesma organização e no mesmo dia da semana (o atentado de Sousse também ocorreu a uma sexta-feira), há outra especificidade que liga estas vítimas: a normalidade das suas vidas. Nenhum dos três era activista ou estava ligado a qualquer organismo ou frente religiosa. Maria, Précilia e António eram pessoas com vidas normais, que morreram enquanto desempenhavam actividades tão quotidianas como passar férias, trabalhar ou assistir a um concerto.

mariana.madrinha@sol.pt