Porque a esquerda envelheceu e está hoje numa posição conservadora, de resistência à mudança.
O PCP, que é um dos pilares do Governo, vive ainda nos tempos de Salazar – em que Portugal era soberano, em que as grandes empresas estavam nas mãos do Estado, em que os transportes eram públicos, em que o Estado era o grande empregador, em que havia uma posição de desconfiança em relação à iniciativa privada e ao capital estrangeiro.
É este o país em que o PCP e outros setores da esquerda gostariam de continuar a viver.
A esquerda não quer aceitar que o mundo mudou.
Não quer perceber que a globalização alterou tudo.
Hoje, os países estão em competição uns com os outros, pelo que cada país já não pode fazer tudo o que quer.
Este Governo diz que vai acabar com a austeridade.
Ora, o que aconteceu ao último governante que disse isto (Alexis Tsipras)? Bateu com o nariz no chão e está hoje a cumprir um 3.º resgate.
E o que aconteceu ao penúltimo governante que disse isto (François Hollande)? Bateu com o nariz no chão e está a fazer tudo ao contrário do que prometeu.
António Costa também vai bater com o nariz no chão.
E não vai ser preciso muito tempo para isso acontecer.
Porque a estratégia que definiu está errada.
E se um erro tático não tem grande importância, porque o seu efeito é localizado, um erro estratégico pode ser fatal, pois repercute-se em tudo.
Perante a globalização, Portugal precisa de ter produtos atrativos no estrangeiro e tem de ser atrativo para os investidores estrangeiros.
Sem isto, não há dinheiro.
Nos últimos anos, o país andou no caminho certo, ou seja, deu passos no sentido de ser mais competitivo no mundo global.
Credibilizou-se lá fora (porque cumpriu aquilo com que se comprometeu no programa da troika), reduziu o consumo interno e as importações, aumentou imenso as exportações, equilibrando a balança comercial, e atraiu capital estrangeiro.
Isto implicou um tremendo esforço.
Em primeiro lugar, um enorme sacrifício das pessoas.
Em segundo lugar, a disponibilidade de dois partidos (PSD e CDS) para apoiarem medidas impopulares.
Em terceiro lugar, a capacidade do Governo para resistir a um clima pré-insurrecional, com greves constantes, manifestações quase diárias e perseguições a ministros.
Esta estratégia tinha como objetivo, repito, enfrentar a globalização, tornando o país mais competitivo e virado para fora.
A estratégia do atual Governo, porém, é exatamente a oposta.
O Executivo de António Costa propõe-se virar outra vez o país para dentro, aceitando o aumento das importações e tornando-o menos atrativo para o investimento estrangeiro.
Na verdade, vão ser revertidas todas as leis que conseguiram fazer de Portugal um país mais apetrechado para concorrer no mundo global.
Para começar, as medidas que visavam conter o consumo vão desaparecer.
E aquelas que podiam estimular o investimento e atrair capital estrangeiro – desde a redução da TSU até à ausência de imposto sucessório, passando por certas reformas laborais – vão andar para trás.
Por outro lado, o princípio de que é preciso ‘produzir e poupar’, e que a vida é difícil, foi substituído pelo facilitismo e pela ideia de que o necessário é ‘consumir e gastar’.
Em suma, este Governo projeta destruir o que deu tanto trabalho a construir – e isso é o que causa mais dó e pode vir a revelar-se criminoso.
Nos últimos quatro anos, Portugal empurrou um pedregulho enorme em direção ao cume de uma montanha.
Mas, ao chegar quase lá acima, vieram uns senhores que disseram: «Esse esforço não interessa nada; vamos deixar de fazer força».
Ora, se arrastar o pedragulho até ao cimo da montanha foi dificílimo, o regresso da pedra à base será facílimo: basta deixá-la rolar pela encosta abaixo.
É muito difícil arranjar gente para participar nas dificuldades; mas é muito fácil juntar quem queira participar nas facilidades.
É o que está hoje a acontecer.
Com esta estratégia, o país vai regredir cinco ou dez anos – e depois será muito mais difícil levar outra vez a pedra para cima.
Vamos pagar com juros altíssimos este devaneio.