A decisão de vender aoSantander Totta os negócios mais atrativos do Banif teve um defensor de peso: o banco central de Espanha. O SOL soube que o regulador em Madrid contactou o Banco Popular no fim de semana em que se decidiu a venda, recomendando que esta instituição desistisse do concurso para viabilizar a vitória do concorrente.
Simultaneamente, as indicações informais dadas ao Banco de Portugal eram claras: a proposta do Santander seria a mais adequada.
Na sexta-feira antes da intervenção pública que separou os ativos do Banif, foram recebidas seis propostas de compra da participação de 60,5% detida pelo Estado português no capital do banco. Dia 20 era a data limite para apresentação de ofertas, que chegaram até às 20h. Quatro fundos de investimento internacionais, entre os quais o americano Apollo, disputavam a corrida com dois bancos espanhóis, o Santander e o Popular.
O Banco de Portugal anuncia então que as propostas iriam ser «cuidadosamente analisadas pelo banco e pelo Estado português». Os fundos de investimento foram excluídos à partida, por não terem licença bancária, mas é decidido que os dois bancos espanhóis deviam melhorar as propostas.
No sábado, as duas instituições foram convidadas a reformular as ofertas, mas só o Santander o fez. Nessa mesma tarde, a instituição financeira comunica ao supervisor português que não daria seguimento à proposta: desistia do processo de venda.
Foi Marques Mendes quem primeiro avançou com a notícia da desistência do Popular, no seu comentário de domingo na SIC. Entretanto, o SOL apurou que o recuo se deveu às recomendações do Banco Central de Espanha.
Depois do convite para a reformulação das propostas, os responsáveis do Banco Popular em Portugal contactaram a casa-mãe em Espanha. Ficou claro que a orientação no país vizinho era deixar cair o negócio. Havia recomendações do regulador espanhol para que a compra do Banif não fosse feita pelo Popular, e sim pelo Santander.
Contexto ‘estranho’
Esta orientação é depois transmitida por via informal ao Banco de Portugal. Com apenas dois bancos espanhóis na corrida, há contactos entre os reguladores ibéricos, para acautelar as consequências do desfecho do processo. As recomendações do Banco de Espanha iam no sentido de que o Santander estaria em melhores condições para avançar.
O resto da história é já conhecido. No domingo à noite, o Governo anuncia uma intervenção no Banif, com a venda dos melhores ativos ao banco da família Botín, e uma injeção de 2,2 mil milhões de euros de dinheiros públicos para fazer face às perdas com os ativos menos apelativos, que ficaram sob a alçada do Estado.
A aquisição dos negócios do Banif coloca o Santander Totta como segundo banco privado de Portugal, depois do Millennium BCP, com uma quota de mercado de 14,5% de créditos e depósitos. A aquisição reforça em 2,5 pontos percentuais a quota de mercado e, em apenas um dia, os espanhóis reforçaram a rede com 150 balcões e 400 mil clientes, especialmente nos arquipélagos da Madeira e dos Açores, onde o Banif tem quotas de mercado mais elevadas.
O rápido processo de venda gerou interrogações na banca. Na entrevista que concedeu à SIC, o presidente do Banif, Jorge Tomé, frisou que a venda se deu num «contexto um bocado estranho» e que a equipa de gestão do Banif «não foi tida nem achada» no processo. «O Banco de Portugal (BdP) chamou a si o dossiê e decidiu. O Banif não teve qualquer acesso ao BdP, nem o BdP contactou com o Banif», revelou.
Marques Mendes também levantou questões sobre a exclusão dos fundos de investimento. «Se não tinham licença, então por que é que os fundos foram admitidos a concurso? E o fundo Apollo servia para comprar um grande banco e não serve para um pequeno como o Banif? Isto está muito mal explicado e é muito suspeito», salientou o comentador, defendendo a realização de uma auditoria independente para avaliar as decisões do BdP, do anterior e do atual Governo sobre o caso Banif.