Não desanime, a ascensão deste desporto tem enchido zonas como Peniche ou Ericeira e há muitos mais surfistas, provavelmente solteiros, com quem pode ter dois dedos de conversa. Mas falemos deste, filho de pai alemão e mãe portuguesa, que nasceu em Lisboa, viveu em Oeiras, onde ondas eram uma miragem um pouco distante. Aos oito anos saltou para a Praia Grande, em Sintra – região que criou outros talentos como André Pedroso, Francisco Rodrigues ou Manuel Cotta -, e a proximidade do mar descobriu-lhe a paixão que agora o faz viajar pelos quatro cantos do mundo e competir olhando para nomes como Kelly Slater ou Tiago Pires, o único português a participar no World Championship Tour. O “Saca”, um surfista que em 2011, em entrevista ao i, disse que era o único na elite a ter o 12º ano. Esqueceu-se de Von Rupp, que ainda só tinha 20 aninhos e andava por competições mais pequenas como os TMN Trials em Peniche ou os Prime Hang Loose Pro, onde ficou em nono lugar no ano seguinte. Isto porque os seus pais sempre deram prioridade aos estudos, e se as boas notas não chegassem a casa, o surf ia pela porta de saída.
A disciplina foi ficando na cabeça do jovem. Só que o pai esqueceu-se da influência da música nestas teimosias de miúdos que até têm talento para a coisa. Nos anos 60, andava o patriarca Von Rupp pela Califórnia a ouvir Beach Boys, onde a ligação com o surf faz os arranjos musicais quase de olhos fechados. Uma ideia que agradou a Nic e que, aos 12 anos, o encaminhou para os primeiros campeonatos, e até à primeira vitória, na sua categoria, numa etapa do Circuito Nacional de surf Esperanças, em 1999. A aptidão era evidente, e João Macedo, o atleta/treinador da Surf Academia que lhe deu a primeira prancha, foi o homem que, passando da música para a prática, o empurrou para uma escalada no mar que está só no início.
Nic foi somando vitórias como um 5º lugar no Mundial de juniores – que lhe valeu o “título” de surfista que mais evoluiu em 2008 – ou vice-campeão europeu.
O rapaz que tinha medo das ondas
Bastante metódico, procurou sempre ondas cada vez maiores e de melhor qualidade, quando o surf ainda não era uma modalidade tão profissional e popular como é hoje em dia, especialmente em Portugal. Teve de correr muito para chegar ao nível de destinos como Havai ou Brasil. Os patrocínios internacionais como a QuickSilver ou a Monster, foram batendo à porta do menino do Colégio Alemão, filho do meio de três irmãos, um deles adotado – hoje uma das maiores alegrias da sua vida que até começou por ser questionada, quando tinha apenas 17 anos. Foi tudo isto que o fez entrar no Top 100 no circuito mundial de qualificação em 2013.
Esse ano, talvez o melhor até agora de uma carreira que tem ainda a duração aproximada de um mini tubo, mas com um futuro parecido com uma onda da Nazaré, culmina com o prémio Eurosima de surfista europeu mais mediático. “É o resultado de muito trabalho e investimento, muito tempo dentro de água à procura de bom surf, onde quer que fosse, estivesse um frio de rachar e ondas gigantes, ou ondas divertidas em águas quentes”, disse Nic na altura. Entrevistas, vídeos, publicidade deram-lhe a distinção, mas no ano seguinte, outro desafio, agora em formato de série, o “My Road With Nic Von Rupp”, que no seu já quarto episódio "Four Cliffs" segue o português por quatro das falésias mais perigosas do continente – na Irlanda, em Portugal Continental e no arquipélago dos Açores.
O rapaz que até começou por ter medo das ondas nos primeiros anos por praias no Algarve, aventurou-se por estas falésias durante meio ano, com amigos e um cameraman, que colocaram frente a frente Nic e algumas das tempestades marítimas mais agressivas dos últimos 50 anos, com ondas a atingir os seis metros de altura. Nem parece que falamos do mesmo surfista amedrontado, mas sim, é ele. Se quiser conhecer mais, perdeu a oportunidade no Cinema São Jorge. Mas pode sempre vê-lo online ou esperar pela segunda temporada, descanse.
Em 2014, a par com o mediatismo, garantiu uma vaga no Rip Curl Pro Portugal, defrontando Kelly Slater e John Florence, e terminando na posição 66º, carimbando um lugar nos Primes do ano seguinte.
Agora já só vê a hora de chegar à World Surf League, ganhar mais etapas e dar à “sua grande família surfista” vontade de o esganar por ter ficado à frente na pontuação final. Passamos a explicar: aos 18 anos, Von Rupp telefonou ao Slater a dizer que o queria matar. É assim, às vezes a juventude faz isto às pessoas quando ainda se é um underdog.
Enquanto a World Surf League não chega, Nic espera ter mais tempo para outra família, a sua, e Carlota Barroso. Ah, já se tinha esquecido? Sim, Nic tem namorada. E sim, é dos nomes mais promissores da modalidade em Portugal, e é hiperativo, como já se confessou em várias entrevistas. Onde é que este rapaz vai parar? Em cima de uma prancha, claro, bastará esperar para ver onde esta o levará.