2.Se já era um facto público e notório que a decisão de António Costa preterir o apoio a uma militante, ex-Presidente do PS, em favor de um candidato independente (com escassas ou nenhumas ligações aos socialistas e muito próximo da extrema-esquerda ao longo da sua vida) gerou desconforto na máquina socialista – a tensão agravou-se com as declarações de Sampaio da Nóvoa no debate contra Maria de Belém. Mais concretamente, com a acusação do candidato presidencial apoiado pelo MRPP e pelo Livre de que a candidatura de Maria de Belém nasce da luta interna do partido, resumindo-a a um desejo de revanchismo por parte da facção derrotada (leia-se: do sector segurista e dos mais próximos de Francisco Assis, como, actualmente, Sérgio Sousa Pinto).
3.Pois bem, muitos socialistas sentiram-se ofendidos – inclusive (ou principalmente?) militantes de longas décadas e com peso, a nível distrital e nacional – pelas críticas e acusações contra camaradas de partidas vindas de um não militante do PS. No fundo, o que Sampaio da Nóvoa afirmou foi que um sua adversária na corrida presidencial foi instrumentalizada por uma corrente do PS contra outra corrente do PS: insinuando que a sua candidatura representa ou pressupõe o apoio do PS “puro”, enquanto que a candidatura de Maria de Belém é o rosto do PS “impuro”. Sampaio da Nóvoa, nesta narrativa, seria o candidato do “PS de futuro”, envolto numa frente de extrema-esquerda; Maria de Belém seria o “PS do passado”.
4.Sucede, porém, que, entre os apoiantes de Maria de Belém, encontram-se figuras como Manuel Alegre, Vera Jardim, João Soares, Jorge Coelho – figuras que, independentemente do sue mérito, desempenharam cargos de relevo no partido e nos órgãos políticos nacionais. Figuras que são indissociáveis da história – importante, pois a democracia portuguesa é inconcebível sem partidos políticos fortes e plurais – do PS e, logo, da história política de Portugal. Figuras que têm um passado e que são queridas dos militantes do PS: que autoridade ou que moral tem Sampaio da Nóvoa, uma figura desconhecida que já criticou ferozmente o PS no passado e elogiou largamente o PCP, para se intrometer na vida interna do PS? Quem é Sampaio da Nóvoa para fazer julgamentos de carácter ou de intenção relativamente à candidatura da ex-Presidente do PS, Maria de Belém? – eis a pergunta que tem dominado os espíritos de muitos socialista por estes dias.
4.1.Por exemplo , sabemos de fonte segura, que a estratégia montada por Carlos César (com o devido conhecimento – e apoio! – de António Costa) para enfraquecer e desmoralizar Maria de Belém, em pleno dia de debate com Sampaio da Nóvoa, foi qualificada por Belém como “deplorável”. O que fez Carlos César? Todos sabemos: aproveitando a Comissão Nacional do PS, Carlos César declarou, aos jornalistas, apoio ao candidato Nóvoa. O que deu um ascendente e um argumento adicional que Nóvoa não se coibiu de invocar no debate contra Maria de Belém. Já na véspera, o António Costa , Primeiro-Ministro comentador, nesse momento único de televisão que foi a “Quadratura do Círculo” de sexta-feira, declarara o seu apoio subtil a Sampaio Nóvoa, elogiando a sua prestação no debate contra Marcelo Rebelo de Sousa.
5.Conclusão: este processo eleitoral para as presidenciais vai deixar inevitavelmente marcas no PS: assistimos a uma batalha entre duas facções do partido, com António Costa a derivar por completo para a extrema-esquerda. E a enxovalhar militantes que, por muitas vezes ao longo da sua vida política, lhe deram a mão: é o caso de Manuel Alegre ou de Jorge Coelho. Se Sampaio da Nóvoa ficar em segundo lugar, o PS vai radicalizar-se e acusar Maria de Belém e António José Seguro da derrota nas presidenciais; se Maria de Belém ficar em segundo lugar, a dupla António Costa/ Carlos César vai ter de pedir desculpa pelo tratamento miserável a que submeteram uma ex-Presidente do partido.
6.E esta dupla “maravilha” Costa/César terá de explicar, à exaustão, a razão por que optaram por abdicar do apoio a uma ex-Presidente do partido a favor de uma personalidade ex-militante da LUAR, participante em acções do PCP, orador muito crítico de figuras queridas dos socialistas (como Mariano Gago) em acções organizadas pelo Livre. Enfim, problemas que os socialistas terão de resolver no pós-24 de Janeiro. Para já, uma certeza: vive-se clima de “guerra civil” no PS.