Nuno Melo quer ser líder do CDS/PP e não reza por nossa Senhora Assunção

1.Muito se discutiu sobre a possibilidade de Nuno Melo avançar para a liderança do CDS/PP – houve até alguns jornais que davam como certo a candidatura do eurodeputado centrista. Devemos confessar que nós próprios hesitámos sobre as reais intenções de Nuno Melo – hesitámos entre a candidatura certa e a não candidatura potencial.

2.Um momento, porém, foi claro na revelação do plano político de Nuno Melo: a entrevista à RTP3, no programa conduzido por Vítor Gonçalves, na noite da passada quarta-feira. Aí, Nuno Melo apresentou, de forma subliminar, as razões que iriam sustentar a sua não candidatura – ao mesmo tempo, que já deu a entender as linhas mestras que irão nortear a sua estratégia política para os tempos mais próximos. O discurso de Nuno Melo, na entrevista, não se mostrou adequado ao discurso de um político com ambições de se tornar líder a breve trecho: logo, a decisão da sua não candidatura pareceu-nos natural. E óbvio.

Dito isto, temos que distinguir: há razões que justificam a não candidatura de Nuno melo no imediato; há razões que permitem afirmar que Nuno Melo mantém no seu espírito a ambição, clara e flagrante, de se tornar líder do CDS/PP, no médio/longo prazo. Estes dois planos não se confundem, mas entrecruzam-se. De facto, a estratégia de Nuno Melo condicionou ou determinou as razões do seu não avanço imediato. Passemos a explicar.

Primeiro: quais as razões do não avanço de Nuno Melo para a liderança do CDS no imediato? São as seguintes:

i) Nuno Melo encontra-se demasiado conotado com a liderança de Paulo Portas: Melo apoiou e foi um homem determinante para a execução da estratégia montada pelo ainda líder do CDS nos últimos anos. Nuno Melo deu a cara por Portas. Nuno Melo sofreu as dores de Paulo Portas. Nuno Melo foi incisivo, como poucos ou ninguém, na defesa de Paulo Portas. Logo, a candidatura de Nuno Melo estaria, à partida, já enfraquecida pela ideia de consubstanciar um “portismo sem Portas” – ora, a imitação é sempre pior que o original;

ii) Nuno Melo, ao avançar, levaria à balcanização do CDS/PP. Porquê? Porque Nuno Melo é uma figura não grata das tendências de oposição interna à liderança do CDS – com o grupo de Anacoreta Correia e José Ribeiro e Castro – à cabeça; e, além disso, Melo abriria a discussão de saber quem é o legítimo sucessor de Paulo Portas. Ou, noutra formulação, quem seria o preferido de Paulo Portas – o que poderia alimentar o desejo de João Almeida, Pedro Motas Soares e mesmo Nuno Magalhães de avançar. O que seria a ruptura do núcleo duro do portismo – e, em última análise, do CDS como partido forte e com ambições de poder. Embora Assunção Cristas seja próxima de Paulo Portas, é uma militante do partido recente, pouco ligada ao aparelho, com uma imagem muito forte junto da sociedade civil;

iii) Nuno Melo percebeu que houve um movimento inorgânico de apoio à candidatura de Assunção Cristas que surgiu na comunicação social, que, mesmo antes da apresentação oficial da candidatura, já assinalava o facto histórico de o CDS/PP ter uma mulher como Presidente da Comissão Política Nacional. Inversamente, a dinâmica – o momentum – de Nuno Melo estava em queda. Mesmo que Nuno Melo avançasse (e vencesse) teria Assunção Cristas na sombra, com uma contestação potencial à sua liderança sempre presente;

iv) Nuno Melo falou com os deputados eleitos por Braga , os quais ter-se-ão demonstrado relutantes em abdicar dos respectivos mandatos para permitir a entrada de Nuno Melo na Assembleia da República. O que significa que Nuno Melo não poderia liderar os confrontos com o Primeiro-Ministro, ficando numa posição parecida com a de José Ribeiro e Castro, entre 2005 e 2007 (e que Nuno Melo tanto criticara). Uma eventual candidatura de Nuno Melo padeceria logo deste “pecado original”;

v) Por último, Nuno Melo está muito conotado com ala mais à direita do CDS/PP – numa frase que agora se vulgarizou, é a direita da direita. Enquanto Paulo Portas, desde 2007, “modernizou” o CDS, colocando-o no espaço do centro-direita,

Nuno Melo tem um discurso muito conservador. Enfim, Paulo Portas é um conservador à inglesa – Nuno Melo é um conservador à portuguesa. Com a desvantagem de nunca ter exercido cargos governamentais – Assunção Cristas tem cara de poder; Nuno melo tem cara de oposição.

Todas as razões elencadas acima foram devidamente ponderadas por Nuno Melo – e levaram à sua não candidatura. Contudo, Nuno Melo não desistiu da liderança centrista: Melo limitou-se a virar o jogo a seu favor. Como todas as circunstâncias lhe eram desfavoráveis – e favoráveis a Assunção Cristas -, Nuno Melo saiu de cena, entregou a liderança a Assunção Cristas e vai ficar a assistir.

Se Assunção Cristas se impuser na liderança e chegar ao Governo, Nuno Melo ficará como o eterno senador do CDS. Se Assunção não se impuser, não agradar aos impulsos e exigências da máquina partidária, o CDS não conseguir ter um discurso próprio, diferenciado do PSD – então aí, Nuno Melo terá a estrada livre para chegar à Presidência do partido. O CD, então, dirá: “hit the road, Melo”.

Temos para nós, desenvolveremos esta ideia em próximas oportunidades, que Nuno Melo não acredita ou desconfia do sucesso de Assunção Cristas como líder do CDS/PP. E esta estratégia política de Nuno Melo é que, em rigor, o levou a não disputar a liderança agora. Há, pois, como escrevemos, uma intercepção dos planos das razões da não candidatura – e o plano da estratégia política de Nuno Melo para o médio/longo prazo.

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