PS já tem a sucessão assegurada

Passos Coelho é, afinal, social-democrata e nunca foi um liberal.

De uma maneira ou de outra, a política sempre foi o lugar onde se faz o que é preciso para que o poder seja mantido ou conquistado. Mário Soares foi um camaleão ideológico; António Guterres geriu a sua liderança em minoria com pinças e imaginação; Sá Carneiro foi da ala liberal no marcelismo e em democracia continuou a adaptar a sua ação às circunstâncias; de Marcelo Rebelo de Sousa ou Paulo Portas vimo-los a serem o que em cada momento lhes fazia sentido e até Álvaro Cunhal proclamava aos seus camaradas a necessidade de uma enorme flexibilidade tática para que não se colocasse em causa a rigidez estratégica.

O ex-primeiro-ministro Passos Coelho não fez nada que outros não tenham feito antes. Fez bem? Não, fez muito mal. Mas convém ter senso e não tratar o tema como se fosse uma originalidade, não o é. 

Surpreende-me uma outra coisa: a dificuldade de vislumbrar um futuro líder no PSD. Não é ainda o tempo, o partido reconheceu que Passos Coelho ganhou as eleições em condições difíceis, que merece continuar. E qualquer um que entre em cena arrisca-se a desaparecer para sempre do tabuleiro de jogo.

Descontando o pormenor, o PSD transformou-se num deserto de futuras lideranças. Maria Luís Albuquerque ‘queimou-se’ em contradições; Paulo Rangel está exilado e desapareceu do radar dos portugueses; José Eduardo Martins é inteligente mas (ainda) considerado um franco-atirador; e Luís Montenegro é um excelente político mas precisa de provar que merece concorrer ao Óscar de melhor ator e não ser apenas um premiado ator secundário.  

Em contrapartida, o PS resolveu o problema da sucessão. Dependerá de alguns fatores, mas é nítido que Fernando Medina se posicionou para um dia ser secretário-geral do PS.

Terá que ganhar as eleições em Lisboa a Santana Lopes em 2017 e, dado esse passo, diria que provável, estará preparado para outras caminhadas.

Medina é um político com perfil raro. Está na política partidária há mais de vinte anos, foi secretário de Estado nos governos de Sócrates, vice-presidente da bancada parlamentar do PS, fez cortes difíceis com gente do seu partido como António José Seguro, ocupou o lugar deixado por Costa na Câmara de Lisboa e conseguiu ainda assim manter a imagem impoluta – como se tivesse acabado de chegar, sem telhado de vidro, constrangimentos ou contas por ajustar.

Passo a passo, Fernando medina conquistou espaço. Entrevistas ponderadas, aposta na Feira Popular, na revolução na segunda circular e na defesa da qualidade de vida das pessoas em prejuízo dos carros. Não é para todos.

É um contrassenso. O PS, tão criticado nos últimos anos, está hoje no poder (num terrível equilíbrio instável), mas tem a sucessão assegurada.

E o PSD, que ganhou as eleições mas não uma maioria parlamentar, está na oposição (num terrível dilema psicanalítico), mas dependente da capacidade de Passos conseguir recuperar o poder, o que é tudo menos líquido. Se falhar quem assumirá a liderança em condições de chegar, ver e vencer? Rui Rio? Improvável. Já ameaçou tantas vezes que já ninguém liga ou quer saber do que fará ou deixará de fazer.     

P. S. – Injusto para Santana Lopes ver o seu nome associado maliciosamente ao do irmão. Sabemos que na política há sempre preços a pagar, mas não se faz. Santana Lopes tem sido um bom provedor da Misericórdia, tem legítimas ambições de futuro e deve poder ir a jogo sem reticências.    

luis.osorio@sol.pt