É de uma família de médicos. O seu bisavô, de quem herdou o nome, já tinha sido médico de D.Maria II.
Isso tem alguma graça, porque o bisavô, que eu já não conheci, era um homem muito respeitado. Era amigo do Afonso Costa. Conseguia ter uma posição importante na sociedade conimbricense e conseguiu que o bispo lhe desse os terrenos onde está a maternidade que ainda hoje tem o nome dele. Julgo que a ideia daquela maternidade era dar apoio a mães solteiras, o que para a época era uma coisa vanguardista. Foi reitor da universidade de Coimbra pouco mais de um ano. Tinha ao mesmo tempo proximidade com a monarquia, com a D. Maria e até com a D.Amélia, e com alguns republicanos. Tinha um índice de respeitabilidade que passava por cima dessas questões.
Foi educado para ser médico?
Fui. Claramente que sim, mas fui educado para a cirurgia. Toda esta dinastia – somos todos médicos desde o bisavô para baixo – são do ramo cirúrgico. Nunca achei graça nenhuma à cirurgia. É verdade que tive dúvidas se ia para Direito ou para medicina. Quando eu fiz 60 anos a minha mulher organizou uma festa surpresa e o Marcelo dizia simpaticamente que eu era um tipo muito sensato, muito maduro para a idade e que era bom a tudo. Não era muito bom como ele, mas era bom. Não tinha 12 numa coisa e 18 noutra. Tinha 16 ou 17 a tudo. Acabei por ir para medicina, não achei graça nenhuma ao curso durante três anos, ponderei vir-me embora, mas depois comecei a gostar do curso. Mas os primeiros anos foram uma chatice.
Tem ligações a algum partido político?
Eu fui um opositor do Estado Novo e fiquei muito satisfeito com o 25 de abril, mas nunca me consegui encaixar em nenhum partido. Sou um social-democrata. Não me pergunte qual é a diferença entre os programas do PS e do PSD porque eu não sei. Acho que é uma diferença de clientelas. Andarei sempre nessa área da social-democracia, mas não tenho esperança de vir a ser sequer um simpatizante de uma força partidária. Já perdi essa expectativa.
Mas não acredita que a situação do país pode melhorar?
A situação é complicada. Nós não podemos viver de expectativas de maiorias absolutas e acho que as pessoas têm de negociar e têm de se entender como acontece por toda a Europa. Esta coisa de não se poder falar com partido do lado não me agrada. E, portanto, não reconhecendo que esta situação seja estável e duradoura agrada-me o principio de vários partidos se entenderem para formar um governo e espero que isso fique e que amanhã se possa fazer com outros partidos e de outra maneira e que haja consenso em relação aos grandes desígnios nacionais.
O que tem sido difícil.
Faz-me alguma confusão. A primeira coisa que eu fazia era proibir que se mudassem os programas na Educação durante dez anos. Não é normal isto. Cada ministro que chega muda tudo. E depois dizem-me: ‘E então o que fazias às clientelas partidárias?’ Que se lixem as clientelas partidárias. E é aqui que eu fico fora de jogo. Isto é a versão pessimista. A versão otimista é pensar que isto foi sempre assim e é um país ótimo para se viver.
Já passou muito tempo da sua vida ao lado do chefe de Estado. O que acha da função do Presidente da República?
Acho aquilo um emprego horrível, aquilo é uma chatice. A quantidade de pessoas que o tipo tem que ouvir, e depois não me parece que tenham assim tanto poder. Devem sentir-se infelizes nalgumas alturas. Perdem toda a privacidade. Com toda a franqueza não me convenciam.