É oficial: Rui Rio quer tirar a liderança do PSD a Passos Coelho

1. Se alguém em Portugal ainda tivesse dúvidas sobre o estado de espírito de Rui Rio, elas foram definitivamente dissipadas ontem. Por quem? Pelo próprio Rui Rio em artigo publicado no “Jornal de Notícias”. É caricato que alguém se sinta na necessidade de publicar texto refutando as críticas e os comentários – todos muito benévolos,…

2. Admitimos que esta é uma postura original: é ir ao Congresso sem ir ao Congresso. A lógica de Rio é “não vou ao Congresso – fico em casa a ver o Congresso e falo nos jornais na segunda-feira. Ah, tudo bem, não vou ofuscar o líder com o tamanho do meu brilhantismo e ego; mas falo depois dele no JN de segunda”. Rui Rio estabeleceu aqui uma nova forma de falar aos congressistas – mais económica, mais impactante, mais cínica. Mais económica, porque dispensa a deslocação física ao local do congresso, com custos inerentes à rodagem do carro – até porque Espinho e Porto são cidades muito distantes.

2.1. Mais impactante, porque, no espaço mediático, nasce logo a dúvida sobre o significado e o sentido das palavras de Rio – não se perdendo tão sábias e geniais palavras por um desfile imenso de discursos, intervenções e salva de palmas (que, aliás, não foram muito abundantes no último congresso – significa que o PSD está a repudiar a política espectáculo? Ou será por outras razões?). Mais cínica, porque é dizer que não se quer ofuscar o líder, que se está fora da corrida à liderança – mas, no conforto do seu lar, esteve muitíssimo atento ao congresso e às tais intervenções intermináveis dos militantes de base do PSD.

3. E o que escreveu, então, Rui Rio? Escreveu um artigo a explicar que é muito humilde, que (quem o conhece bem e está de boa fé – o que significa que há quem o conheça bem e esteja de má-fé) os amigos sabem que é muito pouco vaidoso e tem um ego pequenino. E que a entrevista de quinta-feira estava agendada há dois meses com os jornalistas da TSF, coincidindo – por acaso! – com a data do congresso do PSD.

 3.1.Em suma: pior a emenda que o soneto. Mais valia, Rui Rio ter permanecido em silêncio. O artigo publicado no JN roça o…enfim…patético. E afirmamo-lo com tristeza e amargura: consideramos que Rui Rio é um activo importante do PSD que se está a colocar numa situação muitíssimo delicada.

4. E Rui Rio comete um erro fulcral: ao dizer que a entrevista já estava marcada há dois meses, Rui Rio acaba por confessar que a entrevista foi planeada para coincidir com o congresso do PSD. É que há dois meses (até há mais!) já se conhecia a data de realização da reunião dos sociais-democratas – ou seja, Rui Rio geriu com fins politicamente orientados a sua participação no espaço mediático. Houve meditação na tentativa de condicionar o congresso do PSD do último fim de semana. E quem tenta condicionar os congressos do partido? Quem tem ambições políticas, maxime quem quer desgastar a actual liderança de Pedro Passos Coelho – e assumir-se como o sucessor natural. Daí tanta sensibilidade quanto a piadas, a ironias e a medições do tamanho do seu ego.

5. Além disso, Rui Rio arranjou um outro pretexto para a realização da entrevista: o início da Comissão de Inquérito ao caso Banif. Mais um acto falhado. Primeiro, porque a Comissão de Inquérito iniciou-se no princípio da semana – e não no seu fim. Rui Rio deu a entrevista na quinta-feira – já não de antevisão, mas de balanço da primeira semana. E porque quer Rui Rio comentar o caso Banif? Porque objectivamente incomoda a actual direcção do PSD, sobretudo depois de Passos Coelho ter escolhido Maria Luís Albuquerque para Vice-Presidente do partido.

5.1. Em segundo lugar, Rui Rio, ao revelar a combinação da entrevista e os termos em que foi feita, mostra que tem uma agenda própria – e não faz nada por acaso. Mais: Rui Rio já tem máquina, começa a construir equipa -e apostará tudo em 2017, exigindo contas a Passos Coelho sobre os resultados nas autárquicas. E conta que Marcelo Rebelo de Sousa aguenta o Governo de António Costa até lá.

6.Tudo dito e somado, a conclusão é cristalina: Rui Rio já está a trabalhar para tirar a liderança do PSD a Pedro Passos Coelho.

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