Nós já fomos esbofeteados por João Soares

1.Hoje, o dia prometia: festa com Draghi e receção ao senhor todo poderoso da Europa como aperitivo; as bofetadas prometidas por João Soares aos cronistas que ousassem criticar Sua Excelência, Sr. Ministro da Cultura. E não foi uma mera proposta destinada a uma generalidade de destinatários – esta promessa pública de bofetadas teve destinatários certos…

2.Os portugueses surpreenderam-se pela agressividade revelada pelo Ministro que zela pela nossa cultura, pela erudição nacional, pela alma criadora lusitana. Há quem diga que toda a ação humana acaba por se traduzir num ato de cultura – pois bem, neste sentido, as bofetadas de João Soares poderão apenas consistir numa ajuda direta do Ministro à criação cultural nacional. João Soares talvez se considere um verdadeiro artista – e um talentoso artista (ou um artista talentoso…) e resolveu dar o “corpo ao manifesto”. Ou fazer uma requisição administrativa, pedindo a Vasco Pulido Valente e a Augusto Seabra que dêem…a cara ao manifesto político de Soares.

3.Mas qual a razão pela qual se confere tanta relevância a uma irrelevância política como João Soares? João Soares prometeu dar bofetadas a Vasco Pulido Valente. Tudo bem, pronto. Sigamos para a frente. Numa época de discursos políticos redondos e de salamaleques, tais promessas públicas de João Soares têm o seu grau de piada. Divertem-nos. Já que não há dinheiro para distribuir, já que a geringonça caminha a passos largos para novo pedido de assistência financeira internacional – ao menos, aproveitemos estes momentos de descontracção e boa disposição no trabalho.

4.João Soares diverte-se a prometer dar bofetadas a Vasco Pulido Valente quando o encontrar na rua – nós divertimo-nos com a figurinha do João Soares a dar as ditas cujas. Mesmo que nunca chegue a concretizar a promessa, João Soares já nos divertiu. De facto, João Soares tem aquele je ne sais quoi  de Vasco Santana: quando nós éramos crianças, ficámos fascinados pela forma como João Soares teve a coragem de enfrentar….o palhaço Batatinha, apresentador do programa da TVI “Batatoon”.

5.A história é muito simples: o Batatinha (o ator, António Branco) estava a gravar um spot para o genérico do “Batatoon” na Rua Augusta, dando, ao mesmo tempo, uma entrevista para a revista “ Lux”. Com as suas palhaçadas, o Batatinha acabou por se intrometer num passeio que João Soares estava a dar com um diplomata – o que despertou a ira e a fúria do autarca socialista contra o Batatinha. Ficou demonstrado, para nós, a fibra política de João Soares: nem o símbolo da alegria infantil, o símbolo maior da televisão para o público mais novo, o palhaço Batatinha, era suscetível de provocar qualquer medo ou inquietação no vulcão político, na sumidade-mor do Reino, que é João Soares. Também o Batatinha recebeu a promessa de bengaladas – metafóricas?-  de João Soares…

6. Enfim, o país político agitou-se com as bofetadas. Muitos pedem a demissão de João Soares. Ora, não percebemos porquê. Por duas razões: primeiro, João Soares está a contribuir para a cultura nacional, produzindo uma sitcom como há muito não se via.  Em segundo lugar, nós já fomos esbofeteados por João Soares em Outubro – e aí praticamente ninguém se queixou. Haverá maior bofetada na cara dos portugueses do que ter João Soares como Ministro da Cultura? Portanto, todos nós já tivemos esse privilégio de levar uma bofetada de João Soares. Punch!

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