“A minha mãe está a ensaiar”, diz-nos o músico, quando entramos em sua casa. Rapidamente começamos a imaginar o que terá sido crescer numa casa a transpirar música, sob a batuta de uma cantora lírica e de um contrabaixista. “Quando nasci a minha irmã [Catarina] já estudava música, portanto eu também comecei a estudar. Não quero dizer que nunca tive grandes hipóteses de fazer outra coisa que não música porque, na verdade,eu gostava”, recorda Tomás, que é ainda sobrinho do ator José Wallenstein
E se desde tenra idade começou a estudar de violino na Escola de Música do Conservatório Nacional, e em simultâneo a ouvir música pop, com a adolescência chegaram as outras bandas, as de garagem, sob a influência de nomes como os Strokes, os Arctic Monkeys e os White Stripes.
Foi precisamente o convívio com outras bandas que levou Tomás, na altura com 20 anos, a juntar-se a Domingos Coimbra, Francisco Ferreira, Manuel Palha e Salvador Seabra. “Ficámos amigos porque todos tínhamos bandas e gostávamos de falar de música. Eles já tocavam juntos noutro projeto e, por acaso, a minha banda tinha acabado entretanto e nessa altura decidimos escrever umas canções em português”, recorda.
Até então, o músico tinha sempre cantado em inglês. Uma realidade que mudou com este novo coletivo, os Capitão Fausto – nota para futuras entrevistas: nunca perguntar qual a origem do nome da banda para não voltar a ouvir “odeio essa pergunta”. “Pensámos em fazer as coisas como sabemos e com a língua que falamos todos os dias. Quando escrevemos em inglês as pessoas deixam de estar atentas às letras, mas quando se diz qualquer coisa em português já toda a gente está a ouvir. É mais fácil escrever em português porque temos ferramentas mais à mão, mas também torna-se mais difícil porque fica-se mais exposto. Qualquer sílaba ou palavra que diga, é entendida por todos e salta à vista”.
Essa responsabilidade foi assumida por Tomás, que desde cedo começou a escrever as letras para os Capitão Fausto. O resto da produção musical, bem como os ajustes nas letras, ficou a cargo dos cinco elementos da banda – esquema que se mantém até hoje.
Não demorou muito até esta banda de garagem ganhar visibilidade. Foi um efeito bola de neve: à medida que iam tendo mais concertos, não só tinham mais ensaios, como mais pessoas ouviam falar do quinteto e, consequentemente, iam recebendo novos convites para tocar noutros locais. Assim chegou o momento-chave: a editora Chifre e a produção do primeiro álbum, “Gazela”. Estávamos no ano de 2011. “O primeiro disco foi um salto enorme. Nesse ano, tocámos imenso, começamos a ter concertos por todo o lado”. Aos poucos, a música foi-se tornando cada vez mais dominante na vida de Tomás, que foi deixando o curso de Arquitetura em banho-maria. “Tínhamos de ensaiar mais, tínhamos de passar fins de semana fora. E depois começámos logo a gravar o segundo disco, no fim desse verão, quando ainda andávamos a tocar muito”.
Fazer vida no palco
Por “tocar muito”, entenda-se tocar nos maiores festivais do país, entre os quais o Vodafone Mexefest, o Vodafone Paredes de Coura, o Super Bock Super Rock e o NOS Alive. “Nunca senti medo por ter muita responsabilidade. Acho que sempre fiquei nervoso e com adrenalina quando fazia coisas mais difíceis, mas só pela circunstância de estar à frente de não sei quantas pessoas. Nem nunca achei que o facto de um concerto me correr mal era gravíssimo, até porque nós preparávamo-nos para isso e andávamos a rodar as músicas muito tempo antes”.
Foi no meio desta azáfama do verão quente de 2012, que nasceu o segundo disco, batizado de “Pesar o Sol”. O produto final, porém, só surgiu um ano e meio depois devido à falta de planeamento da banda, combinado com a saída da Chifre, um processo burocrático e moroso, e que por pouco não comprometeu o conteúdo do álbum. “As músicas têm um certo prazo para serem lançadas. Quando uma canção é gravada ou escrita, ela representa uma altura específica de quem a escreve, como se fosse uma fotografia. Não é uma coisa voluntária, mas há uma boa parte da vida destas cinco pessoas que é registada quando fazemos um disco. Pela música que andamos a ouvir naquela altura e pelas próprias coisas que andamos a viver, juntos ou separados. Acho que, se tivesse a demorado muito mais tempo, o álbum podia correr o risco de sair fora do prazo”.
Se “Gazela” é descrito por Tomás como sendo enérgico e com um pequeno laivo de ingenuidade, “Pesar o Sol” transparece a agitação que foi vivida pela banda nessa altura. Algo que foi substituído por uma certa calma em “Os Capitão Fausto têm os Dias Contados”, nome do terceiro disco, que chegou às lojas ontem. Nome que deve ter valido ataques de pânico a alguns fãs da banda portuguesa – mas descansem, não há motivo para alarmes.
Ainda assim, Tomás questiona: “Quem é que não tem os dias contados?”. Uma pergunta que espelha os temas abordados no álbum, que passam pelo fim da juventude, uma consciencialização da responsabilidade que isso acarreta, o envelhecimento e até a morte. “Este disco marca muito uma etapa da vida de nós os cinco e um ponto de viragem que se reflete nas coisas que andamos a pensar e a escrever”.
Uma banda só é pouco
Os Capitão Fausto não são o único projeto musical de Tomás Wallenstein. Ainda antes deste último álbum, Tomás criou uma nova banda, os Modernos, composta por três dos elementos dos Capitão Fausto (Manuel e Salvador). “Lembro-me de conversar com o Salvador, de andarmos a ouvir umas bandas mais rock ‘garageiro’ e de herança do punk e tivemos vontade de experimentar. Acho que não temos assim tantos concertos que não possamos fazer uma coisa destas. Mais vale trabalhar todos os dias e poder experimentar outras coisas”. Daqui, saiu um EP com o selo da Cuca Monga Discos, uma editora composta pelo quinteto Capitão Fausto e ainda Joaquim Quadros, António Branco, Diogo Rodrigues e Vicente Futscher, e que não só patrocina outros projetos dos elementos dos Capitão Fausto (Modernos, Bispo e El Salvador), como também lança outras bandas, como os Ganso.
Mas estes são projetos que, por momentos, Tomás terá de deixar para segundo plano. É que, depois de terem apresentado o novo disco ontem, na Casa da Música, no Porto, os Capitão Fausto rumam à capital para um segundo concerto de apresentação, nos dias 28 e 29, no Lux. Para adquirir um bilhete, basta comprar o álbum. “Podes escrever: o disco não é caro e é bonito”. Garantia do vocalista.