2. A água do banho e o bebé. Confesso-me assustado com o tom populista da discussão em torno dos Panama Papers, onde a legítima preocupação com o combate à corrupção, ao crime e à fraude se cruza muitas vezes com voyeurismo e mera inveja. Isto raramente é dito, mas existem razões legítimas para deter uma companhia offshore. Eis alguns exemplos. Muitos países limitam a propriedade de imobiliário por estrangeiros que podem ser ultrapassadas por recurso, digamos, à criação de um no país de destino do investimento ou seja, uma entidade offshore. Ser proprietário em nome próprio num outro país significa sujeição às leis sucessórias desse país, o que pode não ser desejado (situação naturalmente potenciada quando se detém propriedade em várias localizações); a criação de uma offshore pode ser um recurso. Finalmente temos o caso da proteção e diversificação de ativos. Por exemplo, corretores offshore podem não aceitar ordens de investidores americanos mas podem-no fazer se a ordem for colocada por uma offshore detida por esse investidor. Somando, entidade offshore não são necessariamente ilegítimas nem, certamente, ilegais. Representam, muitas vezes, os únicos caminhos pelos quais a integração económica e financeira internacional pode ocorrer, num mundo ainda segmentado por práticas e legislações nacionais.
3. Planeamento e evasão. Muito do acima dito aplica-se também à evasão e planeamento fiscal. Fugir ao pagamento de impostos (evasão fiscal) é crime. Usar a lei e agir para minimizar o seu pagamento (planeamento fiscal) não é. No Reino Unido, na sequência dos Panama Papers, criou-se uma categoria intermédia, o planeamento fiscal agressivo, que seria condenável. O problema é que o barómetro da ‘agressividade’ permitida será o fisco de Sua Majestade, numa violação grosseira dos princípios do Estado de Direito.