José Rodrigues dos Santos. “Escrevo os livros que gostaria de ler. Como não existem, escrevo-os eu”

Em entrevista ao Jornal i, José Rodrigues dos Santos diz-se de bem com a vida e promete continuar a escrever livros para os leitores, que são os críticos que reconhece. 

Nos livros que escreve há muitas passagens que são verdadeiras aulas de história. É o lado de professor a falar mais alto?

Não concebo a escrita de romances sem contar histórias. Embora a minha escola seja a de contar histórias, há romancistas que gostam do exercício da linguagem e isso a mim não me interessa. As histórias têm que ter algum significado. Nos meus romances históricos, como é o caso desta trilogia de Lótus, o que procuro fazer sempre é integrá-las sempre num contexto histórico e filosófico. Nesta trilogia, o contexto é o período da emergência dos totalitarismos e da descolonização do liberalismo e da democracia, que foi o que aconteceu nos anos 20 e 30 – isso é o período histórico – mas também num contexto filosófico. No caso da Filha do Capitão, a questão filosófica era o destino, no Anjo Branco a luta entre o bem e o mal, no caso do Homem de Constantinopla e de Um Milionário em Lisboa (a história do Calouste Gulbenkian) o contexto filosófico refletia sobre o que é a beleza.   

É importante quando um leitor lhe diz que aprendeu algo com o seu livro?

Sim. Já pensei fazer um romance sobre o judaísmo mas depois achei que não havia nada de novo para dizer. Enquanto que sobre o cristianismo ou o islamismo já havia coisas a dizer que as pessoas não sabiam, e mais, que contraditavam muitas das coisas que se diziam, verdades politicamente incorretas que não são na verdade verdadeiras. No caso da trilogia de Lótus, por um lado era importante ouvir Salazar pela sua própria boca, e aqui o que fiz foi copy paste dos seus discursos. Aquelas são as palavras dele.

A expressão “chocho”, que a certa altura Salazar usa a propósito de alguém de quem não gostava, é real?

Sim, é uma expressão que usava. “Aquele é chochinho e tal” significava que o indivíduo não era muito bom. Esse era um traço da personalidade dele. Salazar não gostava de usar o insulto no discurso. E quando queria criticar fazia-o de uma maneira floreada. Não dizia que era mau, dizia que era chocho. Fui buscar isso mas também as origens, por exemplo, do fascismo. 

Descobriu algo sobre o início dos totalitarismos que o tivesse surpreendido?

Uma das coisas que hoje não se sabe, mas que é verdadeiro, é que o fascismo é um movimento de origem marxista. Pouquíssima gente sabe isto. Em certos aspetos, é mais ortodoxamente marxista do que o comunismo. Por exemplo, a crença que os fascistas tinham de que não era possível haver revolução do proletariado sem capitalismo. Isto é marxismo ortodoxo. Marx disse: “Passa-se do feudalismo para o capitalismo e são as contradições do capitalismo que vão conduzir ao comunismo”. Portanto, sem capitalismo não há comunismo. 

 


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