Ao ler os jornais desta segunda-feira (30 de Maio), constatámos que, afinal, os colégios é que revelam tiques autoritários e falta de noção do interesse público…porquê? Porque – imagine-se! – manifestam-se contra uma decisão do nosso líder, iluminado e iluminista, António Costa. Ao que chegámos! Neste país da geringonça, pode (ainda) não haver um crónico défice orçamental ou financeira: ocorreu já um enorme e censurável retrocesso civilizacional e democrático.
O défice democrático já foi seriamente agravado por António Costa, pelo seu extremo-PS e pela extrema-esquerda. E aqueles que deveriam lutar pela liberdade, pelo pluralismo de opinião e de posições políticas – são precisamente os que alimentam o discurso anti-manifestações e de delito de opinião. Lamentável.
Quem esteve, em Portugal, há quatro anos, viajou para o estrangeiro e voltou a território luso nas últimas duas semanas – julgou certamente que o país mudou. Que é outro país. Lembram-se do apelo semanal (ou diário) à indignação durante os quatro anos do Governo Pedro Passos Coelho? Porventura não conseguiremos encontrar um sector profissional que não se tenha manifestado na rua contra Passos Coelho e os seus Ministros – com o aplauso generalizado dos comentadores. E- refira-se- algumas vezes com razão.
Hoje, os colégios (professores, pais, alunos) saírem à rua e assumirem a sua posição política é encarado como um ultraje, como um desafio intolerável ao poder, como uma atitude desabrida contra o poder, como uma prepotência dos cidadãos. Ora, o que mudou entretanto? Saiu Passos Coelho da liderança do Governo – entrou António Costa. E isso é tudo. Muda logo tudo. António Costa é incontestado. Enquanto que em relação a Passos Coelho havia uma presunção de culpabilidade, para António Costa há uma presunção de genialidade.
António Costa é, pois, para muitos comentadores e escritores de política nos jornais, too big to fail. Too genial to fail. Todavia, a polémica em torno da modificação unilateral dos contratos de associação vai custar caro ao Primeiro-Ministro. Porquê? Primeiro, coloca Marcelo numa posição muito delicada, em que terá (qualquer dia, por entre afectos) de tomar posição. E aí terá de optar entre colar-se à extrema-esquerda e ao extremo-PS – ou defender a posição moderada, sensata que sempre perfilhou e que até levou o seu partido (o PSD) a subscrever.
Recorde-se que Marcelo Rebelo de Sousa, enquanto líder do PSD, incluiu no programa do partido a defesa da liberdade de educação. E como comentador foi muito crítico da redução do apoio aos colégios privados decidida pelo Governo José Sócrates. Portanto, se Marcelo apoiar o Governo nesta questão, estará a negar toda a sua vida política, contradizendo tudo o que fez e defendeu nos últimos trinta e cinco anos. Não o irá fazer com toda a certeza: o Presidente da República colocará António Costa no seu devido lugar, chamando-o à razão (a não ser que Marcelo se deixe toldar pela tentação – perigosa – da popularidade fácil). Será uma derrota para António Costa, criando uma desconfiança institucional que só o prejudica.
Segundo, esta polémica acaba por colar o PS à extrema-esquerda, mostrando que se deixou capturar pela agenda de causas fracturantes do Bloco de Esquerda e pelas clientelas sindicais do Partido Comunista. O Ministério da Educação está num caos autêntico: é o elo mais fraco deste fraco Governo. A equipa da 5 de Outubro é de um fanatismo como há muito não se via na política portuguesa. O problema não está na manifestação dos colégios privados, nem no seu desagrado face à decisão do Governo – está, sim, na forma como o Governo, por razões de conveniência política, estraga a vida a muitas crianças e jovens portugueses.
Terceiro, muitos (mesmo da área do centro-direita) criticaram o excesso de atenção mediática que a revisão unilateral pelo Governo dos contratos de associação com os colégios privados tem merecido. Porquê? Porque este é um não assunto e que o Governo poderia bem ter evitado. Pois bem, mas o problema comunicacional nasceu da forma desastrosa como António Costa e Tiago Brandão Rodrigues geriram esta matéria.
Basta pensar na habilidade encontrada pelo Governo para obter o seu intuito político de obrigar as famílias a inscrever os seus filhos na escola pública mais próxima. O Governo revogou um contrato de financiamento (o qual já havia sido renegociado pelo Governo socialista de José Sócrates, em 2011) através de despacho! Ou seja, dispensou negociação com os colégios; segundo, evitou a intervenção do Presidente da República.
É que os despachos, assim como os contratos celebrados pela administração, não estão sujeitos a promulgação ou a qualquer outra intervenção vicarial pelo Presidente da República. O Governo, mais uma vez, a decidir sozinho. A lógica da paz social e do diálogo social, através da concertação, foi abandonada por António Costa – mais uma vez, tudo para agradar a Jerónimo de Sousa e a Catarina Martins.
E há uma grande probabilidade de os tribunais declararem inconstitucional a medida do Governo, juntando a uma derrota política uma derrota jurídica. Subscrevemos, na íntegra, o parecer do Professor Vieira de Andrade, insigne Professor de Direito Administrativo e Direitos Fundamentais da Faculdade de Direito de Coimbra.
Enfim, o conflito que António Costa permitiu que a sua equipa de fanáticos do Ministério da Educação criasse vai custar-lhe muito, muito caro. Ao contrário do que ele julga, Costa – como qualquer outro político – is not too big to fail. E já falhou.