Não sabemos se foi através do Instagram ou da televisão pública chechena – qualquer uma será uma boa fonte para uma equipa dedicada à comédia – mas o desaparecimento do felino mais estimado da Chechénia foi detetado por John Oliver, ou alguém do staff do seu Last Week Tonight. E ter um antigo líder miliciano transformado em marionete do Kremlin, acusado de violar direitos humanos primeiro em conflito com a Rússia depois ao serviço de Putin, era oportunidade a não desperdiçar.
No último domingo este programa da HBO teve cinco minutos exclusivamente dedicados ao tema. E como Oliver é tudo menos meiguinho quando se trata de achincalhar para fazer rir – o presidente do Equador, por exemplo, já lhe chamou um “oximoro” por ser um “comediante britânico” –, Ramzan Kadyrov respondeu à letra, com humor incluído!
“Toda a República da Chechénia está em alerta”, anuncia Oliver mostrando um ar apreensivo para reportar algo que diz não ser “bom sinal”. O homem que diz estar “seriamente preocupado” com o desaparecimento do gato é alguém “cujas forças de segurança são acusadas de raptos e torturas e cuja página na Wikipédia tem toda uma secção dedicada a acusações de violações de direitos humanos – é daquelas secções que nem precisamos de conhecer os detalhes para saber que não pode ser coisa boa”.
Mas Oliver, um britânico que se tornou figura nos Estados Unidos ao abrilhantar o antigo Daily Show de Jon Stewart, até disse que para conhecer o verdadeiro Kadyrov não há nada como seguir o seu Instagram, uma conta que “nos faz esquecer que ele já foi acusado de espancar um detido com uma pá antes de o executar”. Além de partilhar com o extenso contingente de seguidores os “exercícios físicos diários” que fazem dele “uma caneca de bebida energética em forma de vida”, é nessa rede social que o líder checheno “mostra todo o seu amor por Vladimir Putin”.
Algo que “não é surpreendente”, pois Oliver recorda que foi Putin a colocá-lo no poder em 2007, mal celebrou o 30.º aniversário, a idade mínima exigida para assumir a função. “Kadyrov ficou obcecado”, alerta o britânico antes de mostrar uma série de imagens onde este aparece vestido com t-shirts ilustradas com a figura do presidente russo. “A única coisa que ele parece gostar mais do que de Putin – ou de t-shirts com Putin – é de animais”, relembra o comediante antes de exibir imagens de Kadyrov “com um leão ao colo, a trocar mimos com um tigre ou a divertir-se com um cavalo”.
E terá sido esta a gota de água para o polémico líder checheno, cujo aparelho opressivo é o principal suspeito de há pouco mais de um ano ter assassinado, em Moscovo, o principal líder da oposição a Putin, Boris Nemtsov. Kadyrov regressou ao Instagram – rede social dedicada à partilha de fotografias – e colocou uma montagem de Oliver vestido com uma t-shirt de Putin, acompanhada por um texto de 1800 caracteres, ou mais de 300 palavras.
“Oliver lamenta o facto de nos vestirmos com roupa com a imagem do Presidente da Rússia. Sim, milhões de pessoas regozijam-se com a imagem do nosso líder nacional. E têm razões para isso: Vladimir Vladimirovich [nome próprio do presidente russo] é um líder sábio, corajoso e resoluto que consegue resistir a uma campanha inimiga conduzida pelos Estados Unidos e seus assistentes. Graças a ele esmagámos terroristas, incluindo americanos e europeus. Já o país dirigido por Obama, sob o disfarce de operações de manutenção de paz, criou guerras e sangrentos conflitos internos, que matam milhões de pessoas”.
Mas, além da inevitável resposta política, Oliver teve também direito a provar do seu prato favorito – o humor. E logo no tema principal de toda a disputa: o desaparecimento do gato. Depois de ter recuperado uma antiga notícia onde uma pivô aparece a contar que Kadyrov exigiu o “regresso de mais de um milhar de convidados, incluindo crianças, para serem questionados” sobre o telemóvel perdido pelo líder num casamento, Oliver alertou: “Se fez isto por causa de um telemóvel, imaginem com o gato. É isto que quero deixar claro – temos de encontrar o gato do homem. Ontem!”
Diz Kadyrov que “os rumores gatídeos da comunidade indicam que ele tem uma gata familiar, com quem irá formar família”. Retirando todo o peso do apelo ao desaparecimento que levara a sua própria estação televisiva a difundir a mensagem, o militar checheno mostra-se convicto de que “depois dos casos primaveris, o gato regressará às suas paredes nativas – e talvez até traga o seu amor com ele”.