Obrigado, Fernando Santos: fomos “tarzões” em França!

É que o futebol hoje não se esgota na dimensão táctica ou nas incidências das quatro linhas: envolve uma componente estratégica, emocional e humana

A história é contada por Rui Miguel Tovar no seu magnífico livro sobre a história da Selecção Nacional (editora Marcador): no Europeu de 1984, um dos elementos da equipa portuguesa, antes de entrar em campo, gritava “vamos lá que nem tarzões!”. Pois bem, ontem a equipa de todos nós, liderada inteligente e magistralmente por Fernando Santos, foi uma força da natureza, a personificação da vontade de triunfar, uma vitória da personalidade e da estratégia sobre a sobranceria e a falta de humildade da equipa francesa.

Ao contrário do que defenderam muitos “catedráticos da bola”, Fernando Santos não joga feio: joga bonito. A equipa de Portugal orientada por Fernando Santos joga muito bonito. Duvida? Então mas haverá algo mais bonito do que ganhar o Euro? Haverá algo mais bonito do que entrar para o clube restrito dos vencedores desta competição disputada pelos melhores jogadores das nações europeias? Claro que não: a beleza da nossa vitória de ontem é ilustrada pelas imagens de Cristiano Ronaldo, João Moutinho, Pepe, Rui Patrício e toda a equipa lusitana a vibrar, erguendo bem alto a taça que agora pertence à nossa Nação.

Haverá algo mais bonito do que este momento, a um tempo, redentor do passado e revigorante para o futuro – do que festejar este feito inédito da nossa história colectiva (e não só em termos desportivos) com os nossos emigrantes em França? Os portugueses são o máximo. Portugal é o máximo – como muito bem salientou o nosso Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Fernando Santos ganhou, pois, com inteligência, perseverança, obsessão ganhadora (que obsessão tão boa!), patriotismo, sentido de responsabilidade e oportunidade histórica. Fernando Santos não se limitou a conquistar esta vitória para os portugueses; antes, Fernando Santos ganhou com os portugueses. Não se fechou numa redoma dourada – a Selecção interagiu e muito beneficiou com o apoio incondicional dos portugueses em Paris. Com os portugueses em toda a França. Com os portugueses em Portugal. Com os portugueses em todo o mundo. E, pelo seu exemplo, inspirou os jogadores portugueses a não se ensimesmarem nos seus cálculos pessoais ou nos seus tiques de vedetas (que, aliás, estes nossos jogadores não tiveram, nem têm). No passado, os tiques de vedetismo impediram que Portugal voasse tão alto como voou ontem. Cristiano Ronaldo e restantes jogadores foram grandes homens – o que é mais (muito mais!) do que ser grandes atletas ou grandes craques.  Em boa hora Fernando Santos assumiu os destinos da nossa equipa! Portugal já exigia um treinador da sua qualidade técnica e com as suas virtudes humanas – Fernando Santos já merecia ser seleccionador de Portugal. E o primeiro Seleccionador a conquistar um título, no mais alto escalão, para o nosso país.

O jogo de ontem foi, de facto, épico. Quase shakesperiano, com a descida aos infernos (lesão de Cristiano Ronaldo), a fortuna (a exibição soberba de Rui Patrício – merecia ser o melhor jogador em campo e foi, sem dúvida, o guarda-redes do EURO 2016 – e o ajuste de contas divino, com o “patinho feio” a conquistar o lugar de imortal na nossa História (o magnífico golo de Éder). Os críticos de Fernando Santos não acertaram em nada – o que constitui um facto animador e patriótico. Afinal, os profetas da desgraçada, que sempre lucraram com a exploração de um pretenso “fado português”, podem ser derrotados.

Uma palavra derradeira para dizer que Cristiano Ronaldo é, de longe, o melhor jogador do mundo. É que o futebol hoje não se esgota na dimensão táctica ou nas incidências das quatro linhas: envolve uma componente estratégica, emocional e humana. Uma componente de liderança decisiva – e Cristiano Ronaldo é um líder por natureza, o que dá razão supervenientemente a outro odiado dos “catedráticos da bola” chamado Luiz Filipe Scolari. A forma como Cristiano Ronaldo reage à dura e injusta adversidade (não estamos tão certos de que não há malícia, para não dizer dolo, na conduta de Payet) e estimula a equipa é um acto de grandeza humana, uma lição de liderança e uma demonstração de fé e dedicação por uma causa. Que era, afinal, a nossa causa. É ver a forma como Cristiano Ronaldo inspira Éder , transmite-lhe confiança – e depois a forma como os dois festejam o golo.

Nós somos suspeitos, na medida em que somos admiradores confessos de Cristiano Ronaldo. Contudo, parece-nos evidente que Cristiano Ronaldo ganhará facilmente e justamente mais uma Bola de Ouro – ele é, sem dúvida, o melhor jogador do mundo. E para nós, juntamente com a toda a equipa portuguesa, foi a figura do EURO. Até porque converteu as fraquezas que lhe eram apontadas pela crítica em forças e virtudes. Haverá maior feito? Agora, há que recuperar rapidamente pois ainda há muito para ganhar, Cristiano!

Quanto ao mais, Rui Patrício – enorme guarda-redes. João Mário – jogador soberbo e com uma classe fascinante. Adrien Silva – muito competente. Renato Sanches – brutal, uma energia inesgotável e um dinamismo inigualável. Pepe – imperial, o homem intransponível. José Fonte – um defesa exemplar. Éder – o nosso herói. Raphael Guerreiro – a revelação do EURO,  um defesa esquerdo como há muito não se via…

Mais importante: Viva Portugal! Somos campeões! Portugal allez!