Quem olhar para a azáfama diária no Grande Bazar de Istambul, o maior mercado tradicional do mundo, com mais de 60 ruas interiores e cinco mil lojas, dificilmente achará que a economia turca está com dificuldades.
Um dos espaços mais icónicos da cidade turca recebe diariamente entre 250 mil e 400 mil pessoas que ali vão comprar joias, cerâmica, tapetes ou especiarias, numa vertigem de consumo que os mais distraídos poderiam confundir com vitalidade económica. Mas essa correria é ilusória. O golpe de Estado falhado e a resposta do regime de Erdogan trazem nuvens negras a um país que nos últimos anos cresceu graças a investidores e turistas estrangeiros, que agora estão a fugir.
Na fronteira entre o Ocidente e o Oriente, a Turquia sofreu uma grave crise no início do século. Perante desequilíbrios das contas externas, pediu assistência financeira ao Fundo Monetário Internacional (FMI) em 2001, ano em que o PIB caiu 5,3%. A receita prescrita por Washington não foi muito diferente da aplicada noutros países: a maior liberalização das atividades económicas do país estava no programa do FMI.
Crescimento económico
Erdogan, no poder desde 2003, conduziu as mudanças preconizadas para o país. Levantou múltiplas regulações económicas, atraiu capitais estrangeiros, e a economia viveu um período de forte desenvolvimento, com uma taxa média anual de crescimento superior a 6%, entre 2002 e 2007. Quando chegou a grande crise financeira internacional, o país também sofreu, mas recuperou nos anos mais recentes. No ano passado, apesar de alguma incerteza trazida por atentados, a Turquia cresceu 3,8%.
O problema é que as reformas desenhadas pelo FMI e implementadas por Erdogan não conseguiram corrigir os problemas de fundo do país. Com fraca produtividade e pouca participação das mulheres no mercado de trabalho, há ainda um longo caminho a percorrer. «O crescimento é baseado no consumo e está dependente de poupanças externas, tornando a economia vulnerável a choques externos», resume o FMI, no último relatório que fez sobre a Turquia.
Embora tenha uma agricultura pujante e setores altamente exportadores como o automóvel ou os têxteis, o país depende de capitais estrangeiros para investir e de turistas para crescer. Quando muitos já estavam de pé atrás com os sucessivos ataques terroristas desde o ano passado – o último foi em junho e matou dezenas de pessoas no aeroporto de Ataturk -, a convulsão em que o país entrou na última semana foi a gota de água.
«Neste momento, o capítulo do turismo na Turquia está a acabar», resumiu Zekiye Yucel, diretor de uma empresa de percursos turísticos na Turquia, ao Telegraph. «Temos visto algumas coisas muito feias desde a tentativa de golpe e isso criou muita raiva no país. É mais prejudicial para o turismo do que os ataques terroristas», continua.
Quebras nas empresas
Mesmo antes do golpe, havia hotéis e agências de viagens com quedas entre 40% e 60% no número de reservas para o país, devido ao receio de incidentes com terroristas. «Assim que ocorreu o ataque no aeroporto, fomos bombardeados com telefonemas de clientes a dizerem que já não queriam ir nos cruzeiros», revelou ao New York Times o diretor de uma empresa norte-americana de cruzeiros que trabalha com a Turquia.
E teme-se agora que à falta de turistas se some a falta do dinheiro estrangeiro que tem possibilitado ao país crescer nas últimas décadas. As principais agências de rating já estão a pôr o país sob pressão. A Standard & Poors desceu esta quarta-feira o rating do país e o risco de isolamento financeiro foi um dos riscos apontados, após a tentativa frustrada de golpe de Estado. «Espera-se um período de maior incerteza que pode travar a entrada de capitais», justificou a agência, que teme ainda o enfraquecimento dos contrapoderes institucionais que controlam o peso de Erdogan.