Fisco está a exigir descontos de IRS em excesso

Reembolsos do IRS vão atingir um valor recorde. Finanças retiveram demasiado imposto à cabeça em 2015 e no acerto tiveram de devolver. Situação não foi totalmente resolvida este ano, garante a PwC.

O prazo legal para completar os reembolsos do IRS só termina no final de agosto, mas os pagamentos feitos pelas Finanças até ao momento já atingiram o montante mais elevado de que há registo. As Finanças aplicaram demasiados descontos à cabeça nos salários e pensões do ano passado e tiveram agora de fazer o acerto. E, segundo uma análise da PricewaterhouseCoopers para o i, o problema não foi completamente corrigido este ano.

Segundo os últimos dados do Ministério das Finanças, foram já reembolsados este ano 2,25 mil milhões de euros no IRS. De acordo com os dados publicados pela Direção-Geral do Orçamento, é o valor mais elevado de que há registo desde 2010, quando as Finanças começaram a divulgar nos boletins mensais os reembolsos de IRS.

A Reforma do IRS O que explica este salto nos reembolsos são descontos acima do que seria necessário, em virtude da reforma do IRS levada a cabo pelo anterior governo. Esta medida, introduzida pelo ex-secretário de Estado do CDS, Paulo Núncio, resultou numa beneficiação das famílias com filhos e num aumento do valor das despesas elegíveis para deduções à coleta, como as de saúde.

Segundo explica a fiscalista Ana Duarte, da PwC, a reforma do IRS resultou numa redução generalizada das taxas de retenção na fonte do imposto – o que é cobrado adiantado todos os meses e entregue às Finanças.

“Porém”, frisa, “para a maioria dos contribuintes a redução da taxa de retenção na fonte foi menor do que a redução da taxa efetiva anual de tributação, a qual considera o imposto total anual devido”. Isso fez com que, nos contribuintes com maiores rendimentos, os descontos fossem superiores aos necessários para pagar o imposto devido por lei.

 Os contribuintes menos afetados com esta situação foram os que auferem rendimentos mais baixos – aproximadamente 800 euros mensais por titular. “Para níveis de rendimentos superiores, o ajustamento das tabelas de retenção na fonte não acompanhou a descida da taxa efetiva de tributação final, o que conjuntamente com o aumento das deduções à coleta levou a um aumento do reembolso de IRS”, acrescenta a especialista em questões fiscais.

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais já tinha admitido numa entrevista ao “Negócios” que a reforma do IRS poderia ter mais custos do que os previstos por Núncio. “O governo anterior subestimou o custo do quociente familiar e também das deduções de saúde (…), pelo que estes reembolsos, em princípio, estarão mais concentrados nas famílias com filhos, que tiveram uma cobrança de IRS excessiva em relação ao que estava na lei”. Com a fase de reembolsos prestes a terminar, confirma-se esse cenário.

Poupança forçada O governo PS levou a cabo uma “reversão” parcial da reforma do IRS, eliminando no Orçamento do Estado o quociente familiar que beneficiou as famílias com mais filhos. Foram depois aprovadas novas taxas de retenção da fonte para vigorar este ano, mas Ana Duarte garante que a sobrecarga excessiva dos salários e pensões ainda não desapareceu. “Verifica-se que existiram ajustamentos mas aparentam não ser suficientes para corrigir na sua totalidade o efeito excessivo das retenções na fonte de IRS”, considera.

Claro que nem todos os contribuintes se sentem desconfortáveis com o fenómeno da retenção excessiva. É sempre mais agradável ter mais reembolso de imposto do que ter de fazer um pagamento adicional, que pode trazer problemas aos orçamentos familiares. Mas o ideal, frisa Ana Duarte, é que o valor da retenção na fonte ao longo do ano fosse “muito próximo do valor final a pagar”. Como estão hoje, “acabam por se consubstanciar numa poupança mensal forçada” e “representam uma fonte de financiamento do Estado”.

Certo é que, apesar de haver mais reembolsos este ano, houve também descontentamento dos contribuintes com a demora de alguns processos. O Ministério rejeitou demoras nestes processos. Segundo as Finanças, até 28 de julho tinham sido processadas 96% das declarações. Apenas as “situações mais complexas” e que exigiram “um maior cruzamento de dados” foram deixadas para o fim.