A crise dos bancos

A banca, que hoje atravessa uma crise, é um sector especial

Não há economia para tanta banca neste país» disse há uma semana José de Matos, presidente demissionário da Caixa Geral de Depósitos (CGD). O débil crescimento económico em Portugal afecta a rendibilidade do negócio bancário. E não se vê recuperação na economia portuguesa, pelo contrário.

Outros factores prejudicam hoje o negócio bancário, em Portugal e na Europa. As baixas taxas de juro (algumas até negativas) reduzem a margem de lucro dos bancos, por muito pequenas que sejam as remunerações pagas aos depositantes. E tornam-se cada vez mais severas as exigências dos reguladores quanto aos níveis de capitalização dos bancos. Até o Deutsche Bank atravessa uma fase difícil, tendo os seus lucros caído mais de 80 por cento na primeira metade do corrente ano. E o segundo maior banco da RFA, o Commerzbank, enfrenta dificuldades. 

Por outro lado, a crescente utilização da internet na relação dos clientes com os bancos dispensa pessoal e agências, embora não reduza a rendibilidade do sector. Também por isso a banca está a encolher: desde 2008 terão sido dispensados cerca de doze mil funcionários bancários em Portugal; e muitos outros serão afastados nos próximos anos. Em 2014 e 2015 fecharam mais de mil agências na zona euro.

Neste quadro, os sistemas bancários de Portugal e sobretudo de Itália suscitam preocupação, por causa do grande volume de crédito malparado – empréstimos que não são pagos. O malparado atinge em Portugal à volta de 20 mil milhões de euros, 16 por cento do crédito concedido; e 18 por cento em Itália – mas em valor absoluto o crédito malparado em Itália é dezoito vezes maior.
   
Em Portugal tivemos uma sucessão de desastres bancários, o mais grave dos quais foi o colapso de BES-GES. Agora, é a chocante inépcia governamental para dar um rumo ao banco do Estado, a CGD, que ameaça o sistema financeiro.   

Talvez por ser italiano, o presidente do BCE, Mario Draghi, é sensível ao problema do malparado. Propôs a criação de um mercado para comercializar carteiras de crédito – ou seja, para vender, evidentemente com desconto em relação ao valor facial, créditos malparados que entretanto seriam titularizados. E quem pagaria a diferença entre esse valor e o preço, mais baixo, da venda dos títulos? Draghi avançou com a ideia de criar um fundo europeu de capitais públicos para absorver uma parte dessa diferença (em Itália existe um fundo privado, mas com garantia do Estado, para este efeito).  

Voltaríamos, assim, ao financiamento de empresas privadas – os bancos – com dinheiro dos contribuintes. Situação que se quis evitar, no quadro da União Bancária da zona euro, ao atribuir os prejuízos dos bancos em situação de falência aos seus accionistas e credores, poupando o contribuinte.

Só que o contribuinte de alguma forma beneficia de um sistema bancário que funcione, porque daí depende em larga medida a saúde da economia. Por isso a ideia de que existem bancos grandes demais para poderem ser deixados falir (too big to fail) não é tão escandalosa como parece à primeira vista.
   
A banca é um sector especial. O leitor já reparou que os bancos criam dinheiro? Se eu deposito mil euros num banco num depósito à ordem, continuo a dispor de todo esse dinheiro; mas o banco empresta parte dele a uma empresa, aumentando a quantidade de moeda em circulação.